A vovó e a hora da disciplina física
Aí o assunto fica grave! Se até este momento estávamos falando de coisas periféricas como maquiagem e esmaltes, agora precisamos ir mais fundo. E nada pode suscitar mais discórdia no relacionamento pais e avós do que a disciplina. E temos aqui duas categorias de avós: aquelas que acham que a criança deve ser disciplinada com vara e aquelas que discordam veementemente deste tipo de disciplina. Vamos falar de cada um, separadamente.
– As avós que desejam que seus netos sejam biblicamente disciplinados
Pode ser que você tenha uma excelente visão sobre o papel dos pais em relação aos filhos. Pode ser que tenha lido muito a respeito e tenha vivência cristã suficiente para saber que a vara da disciplina em amor é uma ordem bíblica. Mas talvez você tenha descoberto estas verdades tarde demais e nunca as usou com seus próprios filhos, fazendo com que eles tenham pensamentos distintos sobre este tema. Ou talvez ele tenha mudado de idéia.
Quando for o caso de você perceber que seus filhos estão agindo de forma violenta ou negligente e displicente com relação à disciplina de seus netos, você tem todo o direito de fazer como irmãos em Cristo devem fazer ao perceber atitudes pecaminosas no seio da igreja:
“Exortai-vos mutuamente cada dia, durante o tempo que se chama Hoje, a fim de que nenhum de vós seja endurecido pelo engano do pecado.” Hebreus 3.13
Este é um dever de todo crente! Exortar e admoestar outros crentes quando estão vivendo de forma pecaminosa e desordenada, divergindo da Palavra de Deus.
Esta situação é bem diferente da que traremos a seguir. Neste caso, as avós têm respaldo bíblico para cuidadosamente exortar os pais das crianças. Na circunstância seguinte acontece o contrário…
– A avó não admite que seus netos sejam biblicamente disciplinados
Neste caso, o meu conselho para as avós é que deixem de lado o que pensam e o que fizeram, e se rendam ao que a Palavra de Deus ensina sobre disciplina bíblica com vara. Aqui mesmo no blog existem vários textos que falam deste assunto de maneira bíblica. Se você não entende o modo que seus filhos disciplinam seus netos, procure conversar com eles para tentar entender porque eles fazem como fazem. Leia os livros que eles leram e nunca se ache auto-suficiente o bastante para não precisar aprender mais nada! Reconheça que seus filhos podem ter mais luz que você sobre determinado assunto bíblico. Principalmente porque no tempo em que nós criamos nossos filhos, este era um assunto pouco falado em nossas igrejas e quase não tínhamos literaturas reformadas e consistentes sobre o tem em português. Neste aspecto, nossos filhos são mais felizes que nós! Com o desabrochar da fé reformada em nosso país, eles têm acesso a materiais maravilhosos com os quais nem sonhávamos.
Se, em todo caso, você não quiser se convencer de que a vara da disciplina em amor é mesmo o método que Deus ordenou, não seja uma militante contrária. Como dissemos anteriormente, você pode até discordar, mas não pode se posicionar contra os pais. É das mãos deles que os filhos serão demandados.
Como a vovó pode ajudar de forma consistente e bíblica?
Toda a família da aliança deve estar comprometida em trazer o Evangelho para as crianças. Deus estabeleceu que as gerações estivessem envolvidas na progressão do plano da redenção. Veja apenas um, das dezenas de textos, em que Deus declara a importância da continuidade do Evangelho através dos filhos, e dos filhos dos filhos:
“Far-te-ei fecundo extraordinariamente, de ti farei nações, e reis procederão de ti. Estabelecerei minha aliança entre mim e ti e tua descendência no decurso de suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e de tua descendência.” Gênesis 17.6-7
Em seu livro As bases bíblicas para o batismo infantil, D. H. Small explica como, depois da queda, a família pode ser restaurada pela graça. Ele dá uma perspectiva redentora para nossos filhos:
“O pecado se perpetuou de geração em geração; e a graça, de modo semelhante, se perpetuou de geração em geração. Ambos seguem o mesmo princípio. O pecado pode perpetrar-se através da família; e de igual modo a graça. O pecado se perpetua por meio das relações dos pais, e assim, também a graça. Este é o propósito primordial de Deus na administração de seu plano redentivo. Os filhos estão envolvidos no pacto e na culpa de seus pais; e os filhos estão compreendidos no pacto de salvação oferecido a seus pais. (…) pg 54
(…) A relação que perpetuou a natureza pecaminosa veio a ser agora o instrumento para perpetuar a redenção divina. (…) pg 56
(…) A relação com os pais fora o mais poderoso aliado do pecado, o valioso instrumento pelo qual o pecado adquiriu domínio universal. Este princípio foi resgatado do poder do pecado; foi adotado no pacto da graça; e agora veio a ser útil para a fundação das famílias redimidas. “Onde o pecado abundou [a família], superabundou a graça.” A graça divina transformou a relação dos pais, de veículo transmissor do pecado, em veículo transmissor da redenção. Pg 57
(…) A fé dos pais deve compreender que Deus deseja tomar posse dos filhos como seus próprios filhos. A fé dos pais deve alcançar e envolver seus filhos. Quando os pais se convencem de que seus filhos são indubitavelmente filhos da promessa, terão a esperança e a coragem para a tarefa de instruí-los na terra com a perspectiva de sua herança celestial.” Pg 58
De todas as grandes verdades expostas no trecho acima, gostaria de enfatizar duas:
- Todas as promessas e todas as ordens bíblicas a respeito dos filhos da aliança são dadas aos PAIS e não aos AVÓS.
- Não obstante não ser atribuição direta dos avós a perpetração do Evangelho nas gerações seguintes, eles têm um papel muito importante sim!
Isso significa que a tarefa de ensinar, corrigir, instruir e admoestar as crianças pertence aos pais (Ef 6.4), mas as vovós não só podem, como devem ajudar os pais neste processo. As avós podem reafirmar as grandes verdades ensinadas a seus netos, podem contar as belas histórias bíblicas, advertir sobre pecados, ensinar-lhes músicas e versículos, orar com eles e por eles. Elas devem sempre contar aos netos as histórias de sua vida, de como o Deus daquela família foi fiel desde sempre…
Esta descrição me lembra a avó de Timóteo:
“Lembrado de tuas lágrimas, estou ansioso por ver-te, para que eu transborde de alegria pela recordação que guardo de tua fé sem fingimento, a mesma que, primeiramente, habitou em tua avó Loide e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também, em ti” II Timóteo 1.4-5
Portanto, vovós, nossa ajuda em REFORÇAR o ensino bíblico que os pais dão aos nossos netos é de grande ajuda e valia!
E quando são os avós que tomam conta da criança?
Embora esta não seja, nem de longe a situação ideal, sei que, em muitos casos, por causa da necessidade, as avós precisam cuidar dos netos em tempo integral. Se por alguma situação imprescindível, seu netos ficam com você o dia todo, aí você faz as vezes de mãe. Sei que as mamães não gostam de ouvir isso, mas quem cria nossos filhos é quem passa a maior parte do dia com eles, neste caso, a vovó. Se ela está cuidando diariamente de seus filhos, ela terá que agir, muitas vezes como mãe, disciplinando e corrigindo essa criança. É por isso que esta situação não é o padrão. Imagine a confusão na cabeça da criança: “Quem manda em mim? Quem me disciplina? Quem cria as regras? A mamãe e o papai, ou a vovó?” Mas pense: se a avó, que fica o dia todo com a criança não a corrige como mãe, esta criança se torna indomável, intratável. Se ela a corrige e impõe suas regras, as regras da sua casa, tira a autoridade da mãe. Não há solução fácil para este cenário. Se os netos vivem com as avós, as regras que valem são as dela. Sinto muito. A mãe, embora tenha direitos e deveres, está dividindo-os com outra pessoa.
Cuidar ocasionalmente das crianças para os pais fazerem uma viagem, ir a um jantar romântico ou coisa do gênero, deixa as avós na posição de colaboradoras dos pais. Nestes pequenos períodos devemos acatar suas ordens e aproveitar o tempo com as crianças de forma a honrar aquilo que eles têm aprendido em casa.
Como a mãe deve lidar com os impasses causados pelas avós ?
Esta é uma pergunta que dezenas de mães já me fizeram. Elas oscilam entre momentos de raiva, de pena, de vontade de romper e outros de querer que a relação fosse diferente, acolhedora e respeitosa. Por vezes elas sentem –se pressionadas a ponto de questionarem se estão sendo boas mães, se nunca serão adequadas suficientes para atender às críticas das mães e sogras. Elas se revolvem na dúvida quanto ao que fazer: confrontar a sogra ou a mãe? Engolir em seco? Criar aborrecimento e embaraço abordando o assunto, ou se amargurar ficando calada?
Evitem confrontos
Eu sei que é muito difícil ver seus pais ou sogros intervir em assuntos que não são de sua alçada e ficar quieta. Sei também, que muitas vezes isso acontece porque vocês não souberam lidar com essa situação assim que ela aconteceu a primeira vez, daí foi-se abrindo precedentes. Quanto mais tarde a nova família começar a delimitar seu espaço e até onde os seus pais podem ou não ir, mais difícil será para todos.
Os pais de filhos casados precisam entender que eles são outra família e muitas vezes, são os filhos que terão de ensinar-lhes isso. Se isso puder ser feito de maneira explícita, porém não falada, melhor. Mas se for inevitável parar e conversar sobre as inconveniências do excesso de intromissão…
Cada qual com seu cada qual
Esta é outra regrinha de ouro! Se seus pais estão abusando do direito de dar palpites e de interferir na criação de seus filhos, você mesma, respeitosa e amorosamente deve pedir que parem, explicando a eles que os ama, que deseja sua ajuda, mas que quer ter o mesmo direito que eles tiveram: de criar seus filhos de acordo com suas crenças e seus valores.
Se o problema for com seus sogros, deixe que seu marido resolva com eles!
Uma coisa é certa: nada nem ninguém pode se colocar entre vocês e a educação que vocês querem dar a seus filhos, seja ela melhor ou pior do que a que você teve. Este direito é inalienável, intransferível e foi dado por Deus aos pais!
Eu quero ficar bem pertinho dos meus netos!
Qual avó não deseja ter livre acesso aos netos e cobrir-lhes de carinho? Se você, assim como eu, deseja não só desfrutar da companhia dos pequenos, mas também servir de instrumento de Deus na vida deles e de seus pais, conheça seu lugar. Um lugar de destaque na vidinha deles, um lugar de honra, mas jamais o lugar dos pais. A autoridade máxima para a condução das crianças pertence aos pais, e lutar contra isso é resistir à ordenação de Deus!
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* Simone Quaresma é casada há 25 anos com o Rev. Orebe Quaresma, pastor da Igreja Presbiteriana de Ponta da Areia em Niterói, Rio de Janeiro. Professora de educação infantil, deixou a profissão para ser mãe em tempo integral de 4 preciosidades: Lucas (23 anos), Israel (22 anos), Davi (19 anos) e Júlia (17 anos). Ela trabalha com aconselhamento e estudos bíblicos com as mulheres da Congregação.