the apple gatherers“Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo. Ora, o mundo passa, bem como a sua concupiscência; aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente.” – 1 João 2:15-17.

No seu livro “A Idade da Oportunidade”, Paul Tripp salienta que uma guerra está sendo empreendida para conquistar os corações de nossos filhos. Essa guerra começou no Jardim do Éden e continuará até que o reino do mundo se torne de nosso Senhor e do seu Cristo (Ap 11:15). Ela é um conflito entre a luz e as trevas, o bem e o mau, a justiça e a imoralidade, a santidade e a perversidade. De acordo com Gênesis 3:15, é uma guerra entre a descendência da mulher e a da serpente, ou entre Cristo e Satanás. O mundo em que vivemos é o grande palco dessa guerra, e nele há campos de batalha em todos os lugares:

  • nas cadeiras do governo e dos centros de cultura,
  • nas legislaturas e tribunais populares,
  • nos escritórios e oficinas de negócios,
  • nas feiras e distritos de lazer da cidade,
  • nas faculdades, escolas e igrejas,
  • em nossas casa e famílias e,
  • mais importante, em nossos corações e mentes e nos dos nossos filhos.

Enquanto estivermos neste corpo, precisamos viver no mundo. Refugiar-se ou escapar não é uma opção. A vontade de Deus é que vivamos no mundo como ele é, mas que vivamos aqui como pessoas de Deus – ou seja, devemos estar “no mundo, mas não sermos do mundo”, ou ainda, em termos bíblicos, devemos “viver piedosamente em Cristo” (2 Tm 3:12).

Como pais cristãos, precisamos equipar e treinar nossos filhos para lutar essa guerra. Precisamos ensiná-los e impulsioná-los, com a benção do Espírito, a renunciar o mundo, a crucificar a velha natureza e a andar numa vida nova e santa. Independente de onde seus filhos crescerem, de quais escolas eles frequentarem e do que acontecer em suas vidas, todos eles já foram envolvidos por essa guerra. Deixá-los sem equipação ou sem treinamento para essa batalha é abandoná-los para o mundo.

Então, o que é mundanismo? Mundanismo é o estado de ser ou de se tornar parecido com o mundo, ou ainda, como Paulo diz, é estar conformado com este século (Rm 12:2). Pelo fato deste mundo ser território da humanidade caída, o mundanismo é qualquer atividade humana alcançada sem Deus ou contra Deus, ou qualquer uso das boas criações e dons de Deus para a satisfação de desejos pecaminosos, o que serve, em última análise, as ambições egoístas dos seres humanos caídos. Em resumo, mundanismo é tudo aquilo que é antitético a Deus e que se rebela contra o Senhor e Seu Cristo (Sl 2:2), se recusando a refletir a Glória de Deus tal qual fomos criados a fazer.

O Que o Mundanismo Não É

O mundanismo não é a completa rejeição de Deus. Apesar de tal rejeição ser mundanismo, essa rejeição não é sinônima dele. O mundanismo começa muito antes da absoluta rejeição. Ele começa primeiramente com o fracasso em se ver as coisas pela perspectiva de Deus. Nós não precisamos rejeitá-Lo para sermos mundanos, basta que O ignoremos e sigamos nosso próprio caminho na vida. Basta apenas que flertemos com o mundo, isto é, que professemos nosso amor a Deus, mas que façamos amizade com o mundo em nossos corações e vidas.

Em segundo lugar, o mundanismo não é meramente viver uma vida “anticristã”. O mundanismo pode se ornar externamente de religião, enquanto, na realidade, muitos cristãos vivem vidas mundanas, possuindo uma aparência de santidade, mas negando o poder dela. O objetivo de uma vida cristã é viver somente para a glória de Deus pela fé em Deus e de acordo com a vontade de Deus. Entretanto, todo pecado nos afasta de Deus. Sempre que cometemos pecado, nós rejeitamos o governo de Deus sobre nossas vidas. Então, cristãos professos que pecam podem aparentar ser em nada diferentes das pessoas deste mundo.

Em terceiro lugar, o mundanismo raramente é óbvio. Se todas as tentações fossem óbvias, elas seriam mais fáceis de resistir. Talvez nós pensemos que o mundanismo é como a garota que ama comprar. Ela compra muitas coisas, especialmente roupas novas. Ela usa maquiagem em excesso. Ela vai atrás de todas as últimas tendências. Ela namora apenas os garotos que a fazem se sentir bem consigo mesma. Essa é uma forma de mundanismo, mas uma forma excessiva. O mundanismo não precisa ser tão patente, e raramente o é.

João descreve elementos do mundanismo como “a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida”, ou o desejo por prazer, possessões e a busca por status, riqueza ou fama. É por meio dessas coisas que o mundo apela por nosso amor e lealdade. Nós normalmente minimizamos nossas formas de mundanismo à luz do pecado de outro, mas o mundanismo trabalha no coração e na mente de cada ser humano. Precisamos nos examinar para descobrir as maneiras pelas quais estamos muito parecidos com o mundo.

Uma estratégia comum no campo de batalha é conhecer o inimigo. Isso também é verdade na luta contra o mundanismo, pois ele pode ser bem enganador. O pecado quase nunca aparece para nós como uma besta horrenda – se é que alguma vez apareceu assim. Se o mundo mostrasse sua verdadeira natureza, como casa de servidão, poço de corrupção e reino da morte, muitos sentiriam repulsa por ele. Mas esse inimigo se disfarça como algo agradável, atrativo e fascinante, prometendo grandes recompensas e agindo de forma muito parecida com a “mulher adúltera” de Provérbios 5:3-6.

Vamos examinar em mais detalhes o que o mundanismo é e oferecer algumas sugestões práticas sobre como lutar contra o mundanismo em nós mesmos e em nossos filhos.

O Que o Mundanismo É

Primeiramente, o mundanismo deseja agradar os homens, não a Deus. Ele teme a censura das pessoas e ama os seus louvores. Ele ama mais a si mesmo do que Deus. Ele agrada-se daquilo que os outros aprovam a fim de serem eles mesmos aprovados. Ele procura ser igual aos outros e ser apreciado por isso. Em tempo, esse apelo por aceitação se desenvolve em uma ambição cega por reconhecimento, status e sucesso.

Desde o momento que são bebês, nossos filhos são pressionados a desempenhar para os outros. Se eles estão em frente à televisão, logo aprendem que a felicidade consiste na abundância de coisas. Na escola, nossos filhos são forçados a tirar boas notas para que possam entrar nas melhores faculdades, onde poderão treinar para as profissões mais lucrativas. Eles e seus amigos encorajam uns aos outros a serem populares, a assistirem os últimos vídeos e filmes e a usarem as últimas tendências e as melhores marcas de roupas. Eles também aprendem a enganar os pais, a ganhar favor com os professores, a deixar o chefe feliz e a fazer o que for preciso para ser o primeiro em casa, na escola ou no trabalho. Nossos filhos estão sobre constante pressão para se conformarem com o mundo, a fim de serem bem-sucedidos nele nos termos que ele mesmo dita.

Em segundo lugar, o mundanismo tem mais consideração pelo corpo de alguém do que pela alma, mais consideração pelas coisas externas e materiais do que pelas internas e espirituais. O mundanismo ensina nossos filhos a cobiçarem as melhores roupas, os carros mais badalados, os aparelhos eletrônicos mais tecnológicos, a (o) namorado (a) mais bonito (a) e outras coisas materiais. Nossas filhas aprendem que devem vestir as roupas mais bonitas, cortar o cabelo de acordo com as tendências da moda e fazer tudo o que puderem para ter o visual mais atraente. Nossos meninos aprendem a resistir à maturidade, a se cercar de brinquedos, a buscar dinheiro e a modelar seus corpos à custa de suas mentes. Em todas essas coisas, nossos filhos e filhas buscam a imagem mundana de masculinidade e feminilidade. O mundanismo, tanto no homem quanto na mulher, exalta a aparência externa em vez do “o homem interior do coração” (1 Pedro 3:4).

Em terceiro lugar, o mundanismo ama coisas materiais e busca riquezas. Essa forma de mundanismo é normalmente justificada como o “aproveitar das recompensas” de nosso trabalho duro na vida ou como a satisfação de necessidades básicas. Se precisamos ter um carro confiável, por que não um com todos os aparatos extras? Se precisamos de um lugar para morar, por que não financiarmos para pegar a maior e mais espaçosa casa como vínhamos sonhando? Se precisamos de férias familiar, por que não ostentarmos com cruzeiros ou resorts caros? Nós nos convencemos a sermos autoindulgentes em excesso de muitas formas.

Essa tentação também prevalece em nossos filhos. Eles precisam se comunicar conosco, então por que não presenteá-los com o que eles imploram a nós: um smartphone que tira ótimas fotos, armazena músicas e conecta com a Internet?  Eles precisam de sapatos, então por que não satisfazer seus desejos com o último modelo, mesmo que seja muito caro? Enquanto o desejo por celulares ou sapatos não é em si pecaminoso, o mundanismo pode fundar-se na raiz das necessidades básicas. Riqueza e bens são tentações pecaminosas para todos nós. Jesus confrontou o jovem rico nesse exato ponto e o homem saiu lamentando, pois ele não podia se separar de seus bens, mesmo que fosse pela vida eterna (Mt 19:16-22).

Em quarto lugar, o mundanismo deseja coisas que pertencem apenas a esta vida. Fixarmos nossas afeições em coisas terrenas nos impede de achegarmos a Deus e de buscarmos aquelas coisas que estão no alto. Nossos filhos, que não possuem tanta experiência, conhecimento e sabedoria, geralmente veem a vida em termos apenas do presente. Mesmo adolescentes não desenvolveram ainda o julgamento necessário para ver como suas decisões hoje podem ter consequências destrutivas amanhã. Essa falta de perspectiva coloca nossos filhos em grande risco. Se esta vida fosse tudo o que tivéssemos, certamente diríamos a nossos filhos que vivessem ao máximo. Nosso lema seria “comamos e bebamos, que amanhã morreremos” (1 Co 15:32).

Em quinto lugar, o mundanismo alimenta o orgulho. O orgulho inclui o egocentrismo, a autoaprovação, a autopromoção e a autoindulgência. Pregadores podem se sentir orgulhosos de seus sermões ou do número de pessoas que frequenta seus cultos. Presbíteros podem se sentir orgulhosos de suas posições ou do poder que detêm no conselho da igreja. Esposas podem se sentir orgulhosas de suas casas e móveis, ou das roupas que elas usam para ir à igreja. Nós não podemos apenas dizer aos nossos filhos que eles deixem de ser orgulhosos, porque o orgulho pode estar presente tanto numa boa ação quanto numa má. Nossos filhos podem se sentir orgulhosos de fazer o bem numa espécie de autocongratulação ou de fazer o mau num ato de rebelião e autoasserção. Eles podem se sentir orgulhosos quando são elogiados por seus pais ou quando são repreendidos por eles. Crianças podem se sentir orgulhosas de suas posses materiais ou se ressentirem por não terem as coisas que seus amigos têm. O orgulho, portanto, está presente tanto quando nossos filhos pecam voluntariamente quanto quando eles tentam fazer o bem. Humanos caídos alimentam o orgulho e a alta autoestima. “Com efeito, passa o homem como uma sombra; em vão se inquieta”, diz Salmos 39:6. Para vencer o orgulho, nós precisamos atingi-lo em suas raízes, e fazemos isso renunciando o mundo e crucificando nossa velha natureza.

Continua…

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joel beeke*Esse artigo foi originalmente publicado na revista The Banner of Sovereign Grace Truth (Edição online de Setembro/2012) , traduzido com permissão do autor.

**Dr. Joel Beeke é presidente e professor de teologia sistemática no Puritan Reformed Theological Seminary (EUA). É pastor da Heritage Netherlands Reformed Congregation, editor da Banner of Sovereign Grace Truth, diretor editorial de Reformation Heritage Books, presidente da Inheritance. Foi co-autor, escreveu ou editou mais de 50 livros, dentre os quais, “Vivendo para a Glória de Deus” e “Vencendo o Mundo”. Obteve seu Ph.D. em Teologia da Reforma e Pós-reforma no Westminster Theological Seminary. Ele é convidado freqüentemente para lecionar em seminários e pregar em conferências ao redor do mundo. Ele e sua esposa, Mary, foram abençoados com três filhos: Calvin, Esther e Lydia.

*** Tradução: Rebeca Romero