Introdução:
Há não muitos anos, talvez 30 ou 40, o tema do divórcio e do novo casamento não tinham tanta importância no meio da Igreja. Não que fossem questões consideradas marginais, mas porque não parecia ser um inimigo tão grande naquele período. As famílias eram bem mais firmes e estáveis, os filhos tinham mais certeza que teriam seus pais juntos ao longo da vida. Segundo Jay Adams, a única obra considerável sobre o tema era “Divorce” de John Murray. Um livro de difícil leitura e que nunca fora muito popular. Contudo, hoje as prateleiras estão cheias dos mais variados tipos de livros sobre o tema, quase todos, com boa dose de tradicionalismo e liberalismo e quase nada que emane da Escritura. Diante disso, me proponho a falar um pouco sobre o tema o dividindo em três pequenos artigos, sendo este primeiro mais voltado ao casamento, noivado, namoro e solteirice à luz da Escritura.
Podemos perceber como a Igreja foi tomada por casos e mais casos de divórcios, são inúmeras as pessoas que já estão no terceiro ou quarto casamento e continuam na Igreja, quando não são eles próprios os pastores. O casamento foi tão banalizado a ponto de haver igrejas com uma junta de advogados para lidar exclusivamente com os divórcios de seus membros. Há algo de muito sério acontecendo! Não se pode deixar de dar a atenção adequada a um assunto que mexe com a vida da Igreja de maneira tão profunda. Portanto, faz-se necessário que comecemos a tratar do tema a partir dos seus fundamentos, considerando as pressões próprias da nossa época.

AS PRESSÕES DA PÓS MODERNIDADE
Até pouco antes da década de 60 o casamento era tomado, a priori, como algo plenamente bom e reverenciado pela sociedade. Ainda que houvessem muitos adultérios e outros problemas, estar casado era ser bem visto pelas pessoas. O próprio Estado tinha leis duras contra os infiéis que dificultavam e ameaçavam com punição aqueles que promoviam o divórcio. O mundo tinha uma moralidade mais firme, até que a pós modernidade chegou e abalou as estruturas morais da sociedade.
Se antes a ciência tinha a resposta para todas as coisas, agora em um mundo pós moderno, não existe uma verdade acima de todas as demais. Cada um pode levar a vida que quiser, criar o conceito de família que bem entender. Entretanto, essa aparente tolerância acaba quando alguém “ousa” discordar do senso comum vigente. Nunca a instituição matrimonial foi tão afrontada como na presente era. Ao casamento faltava bases mais sólidas para enfrentar ataques dos militantes gays, dos professores universitários e de tantos outros pseudo-intelectuais.
Aliado a isso, ainda podemos citar o descobrimento das muitas formas de contraceptivos, principalmente da pílula do dia seguinte e todo o tipo de invenções, que trouxeram uma sensação de maior controle sobre a vida humana. Mediante as possibilidades de desfazer as consequências naturais do sexo fora do casamento, como a gravidez indesejada, as pessoas começaram a repensar sobre a necessidade do casamento. Sem bases espirituais sólidas, parece que o casamento perdera o sentido. Ora, se eu posso manter relacionamento sexual com quem quiser e não vou engravidar, e ainda que isso aconteça posso buscar o aborto, para que então casar? O que lhes faltava era conhecimento sobre o que é de fato o casamento!

OS GRANDES RISCOS DA NOSSA ÉPOCA
O fato de vivermos em um mundo onde a verdade de todos parece ser tolerada, parece ser uma oportunidade para que tenhamos mais espaço e respeito quando falarmos sobre o que entendemos a respeito do casamento, mas na prática não é bem assim que funciona. Os extremos estão cada vez mais distantes. Hoje vemos pastores e membros de Igrejas completamente liberais quanto ao divórcio e outros que não admitem a legitimidade da separação e do novo casamento sob hipótese alguma.
Essa semente extremista emana desde o Éden nas palavras de Eva. Ao conversar com a serpente ela acrescenta o que Deus não disse, sendo mais dura que a própria lei do Senhor, e ao mesmo tempo retira partes vitais da Palavra de Deus. Eva cai na conversa da serpente ao exagerar e ao diminuir, pois essa é a estratégia mais perversa do Maligno (Gn.3:1-4). Enquanto, a Escritura busca sempre o equilíbrio e a sabedoria no tratar de todas as causas concernentes à vida humana, os crentes tem se pautado cada vez mais no extremismo anti-bíblico. O pensamento do mundo mais uma vez adentrou à Igreja com seu engano sutil.
O mundo da tolerância, na verdade, é o mais intolerante de todos os tempos. As pessoas estão cada vez mais radicais em seus pensamentos. Os militantes pós modernistas estão prontos a ouvir qualquer verdade, desde que elas não contrariem a sua própria. Essa realidade, infelizmente, não é diferente na Igreja.
Os conceitos mundanos ligados a experiência sexual e ao casamento estão disseminados no seio do povo de Deus. Os jovens não vêm motivo para pensar em casamento antes que tenham conquistado um grau de mestre ou doutor. As moças estão no mesmo caminho. Muitas não sabem fritar um ovo, mas são experts em bolsa de valores, estratégias de marketing e planos de carreira orientadas pelo seu personal coaching. Diante disso, devemos passar a meditar de uma maneira segura, bíblica e criteriosa sobre os fundamentos bíblicos do casamento para todos os tempos.

RETOMANDO AS BASES DO CASAMENTO
A união matrimonial é uma expressão analógica da Trindade e da relação que o Deus triúno tem com sua Igreja. Na eternidade Deus escolheu uma noiva para o seu filho e os uniu misticamente (Ap.21:9,10; Jo.15:1-9). Essa união apresenta a perfeição do relacionamento que o Criador propôs desde o princípio, a qual foi restaurada em Cristo, quando o noivo demonstra completa entrega pela sua amada sendo ele mesmo o provedor da vida, o líder espiritual e o protetor daquela que é alvo do seu amor incondicional (Ef.5:26,27). A Igreja redimida por sua vez, é aquela que vive com alegria a função de auxiliadora (Gn.2:18; Ef.5:24) e faz tudo para glória do seu marido (Pv.31:23).
É pensando nessa união perfeita que devemos analisar o casamento entre um homem e uma mulher. É preciso levar em consideração que essa união tem primazia desde as primeiras páginas da Escritura (Gn.2,3). Foi Deus quem a instituiu, Ele criou o homem e dentre os mandatos que lhes ordenou, um deles dizia respeito ao casamento (Gn.1:28). Veja, Deus regulou a maneira do homem trabalhar e lidar com a criação, regulou também o culto e submissão ao Criador e fez o mesmo com o casamento. Assim, o matrimônio não pode ser realizado ou desfeito fora dos padrões do grande legislador. O casamento instituído por Deus não foi simplesmente um contrato assinado em cartório. Um contrato é válido enquanto as duas partes o mantém de pé ou até quando determinado objetivo é alcançado, depois disso ele se encerra. O casamento, porém, é uma Aliança de caráter público diante de Deus e dos homens.
Além de não ser apenas um contrato, o casamento também não é simplesmente um evento social. Não se deve confundir o casamento com a cerimônia, esta pode ser simples e reservada, ou exuberante e grandiosa. Aquele, entretanto, tem sempre caráter público por envolver a participação do Estado e, por vezes, da Igreja, quando se tratam de filhos da Aliança. Ao contrário do que pensam os romanos, essa união não é consumada por meio da junção carnal, mas do compromisso público. A intimidade do casal apesar de muito importante, não delimita a instituição da nova família. O que consuma o casamento é a Aliança de compromisso feita diante do Estado e da Igreja. Segundo Van Groningen “a cola da aliança matrimonial é também aquela promessa mútua, não só de se submeterem um ao outro, mas de receberem um ao outro como são e, então, estando assim ligados essas promessas serão realizadas em contínuo desenvolvimento que unirão mais fortemente homem e mulher” (Família da Aliança, p.44)
O casamento é um vínculo de fé, uma Aliança espiritual, por isso não pode ser feito entre crente e descrente. Embora os ímpios possam e devam casar, nunca um crente deve se envolver em aliança matrimonial com um descrente. O casamento cristão é a base da família da Aliança que se une ao redor da Palavra em casa, que se apronta para ir junta cultuar, que almeja a Terra Prometida e que entende suas funções no lar conforme determinadas pelo Senhor. Como um ímpio seria o pastor da casa se ele não conhece o supremo pastor (Gn.2:15)? Como uma mulher ímpia se submeteria ao seu marido como a Igreja se submete a Cristo se ela nem conhece essa relação (Ef.22,23)? O povo da Antiga Aliança sempre foi repreendido por Deus quando se envolveu nesse tipo de relacionamento ilícito (Dt.7:2-4; Ed.10). Segundo Malaquias, o relacionamento de um crente com um ímpio é o mesmo que o filho de Deus se casar com um filho de Satanás (Ml.2:11).

O PRIMEIRO CASAMENTO DA HISTÓRIA
Todo casal sonha com o dia do seu casamento e, sendo crentes, esperam que nesse dia estejam presentes seus melhores amigos, família, um oficial do Estado e um Ministro da Palavra de Deus. Isso se dá não por convenção humana, mas por ordem divina, pois foi assim no Éden. Deus, entendendo não ser adequado que Adão estivesse só, providenciou uma esposa para auxiliá-lo na missão. Não é o mesmo que Abraão faz em Gênesis 24:1-3 mandando seu mais antigo servo buscar uma esposa para seu filho, entendendo que não seria bom que Isaque estivesse só? Abraão aprendeu esse conceito do próprio Deus e simplesmente o pôs em prática. Percebemos, então, que não é por meio de uma imposição da sociedade.
Essa relação é tão sublime que Deus didaticamente ensinou não apenas as necessidades dos cônjuges no casamento, mas também suas funções. Deus deu a oportunidade de Adão dar nome a Eva em conformidade com a maneira da criação da mulher, com isso, Deus enfatiza a autoridade do homem sobre sua esposa. Adão havia dado nomes aos animais e cada um desses nomes correspondia a maneira que Deus criou determinado ser vivente. Quando Adão concedeu o primeiro nome a sua esposa Eva, não foi diferente. Ela se chamaria varoa, pois procede do varão (2:23). Após a promessa do nascimento do filho que esmagaria a cabeça da serpente (3:15), o sábio Adão troca o nome da sua mulher para que correspondesse a promessa de Deus. Ela se chamaria Eva (esse nome procede do verbo hebraico “ser, estar”, ela seria mãe dos viventes), porque seria mãe de toda a raça humana, especialmente, de onde procederia Aquele que redimiria não apenas o casamento, mas a alma de todo crente.
Se pensarmos nesse casamento nos moldes da nossa época, não veríamos muitos problemas em perceber a beleza, o romantismo e o compromisso entre as partes desde a primeira união matrimonial. Como um bom pai da noiva, Deus a conduziu até a sua presença (Gn.2:22-24). O Senhor foi a testemunha do casamento (Ml.2:14). Ele também foi o pastor e oficial de justiça (ele tem prerrogativa pelas duas esferas criadas por Ele mesmo, Estado e Igreja) que declarou até que a morte os separe (Gn.2:24, Mt.19:6). Ou seja, se alguém tem alguém alguma dúvida quanto a instituição e regulação do casamento feito por Deus, a Bíblia deixa claro que a união matrimonial está longe de ser uma convenção social que pode ser modificada ao longo do tempo. Ela, sem dúvidas, é uma instituição divina que reflete a natureza do Criador, passamse céus e terra mais a Palavra Dele não muda.

___________

foto augusto braynerO Rev Augusto Brayner é Bacharel em Teologia pelo Seminário Presbiteriano do Norte (SPN-PE) e em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG-PB); MBA (Master In Business Administration) em Gestão de Negócios pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG-PB); Mestrando em Pregação pela Universidade Presbiteriana Mackenzie – Centro de Pós-graduação Andrew Jumper (CPAJ-SPN). Atualmente é pastor efetivo da Igreja Presbiteriana do Alto Branco, em Campina Grande-PB, Diretor do Instituto Presbiteriano de Línguas Bíblicas Rev John Knox, 32 anos e casado com Hellen Brayner, desde 2009.