JGPSG00ZRecentemente deparei com alguns comentários sobre maridos em casa e as esposas que se sentem por eles pressionadas. O problema não é raro, e elas descrevem com palavras ríspidas a sua dor; “ele tem sido agressivo comigo, me trata como se eu fosse uma filha”. Outra escreve “Como todo casamento também vivo os meus dilemas, alguns já superados, outros empurrando com a barriga” e ainda outra pessoa afirma: “ele é muito bruto e arrogante, e isso gera uma série de outros pecados. Viver com esse homem bruto foi e tem sido um desafio… Não tenho mais pique pra aguentar muitas coisas calada, sufocada, sem poder falar pra ninguém, morrendo por dentro em casa num mundinho insignificante pra ele”.

O que acontece quando o casal atinge um sonho de muitos anos, no caso, conseguir a desejada aposentadoria, e a vida fica infernizada? Outro caso com características semelhantes: o que ocorre quando o marido trabalha de dentro de casa e o sonho do casal de passar mais horas juntos em ajuda mútua vira um pesadelo? Minha primeira pergunta a essa mulher cristã de coração ferido é: ele é cristão, compartilha a mesma fé? A resposta será diferente, embora em algumas linhas a mesma, para mulheres que estão em parceria com irmão em Cristo, e as que têm marido que “ainda não obedece à palavra”. A verdade nua e crua é que somos todos pecadores. A mulher cristã não é menos pecadora [1] que seu marido não convertido – apenas uma nasceu de novo enquanto o outro está morto! Quanto ao modo de tratar o marido, tanto a esposa do crente quanto a esposa do incrédulo tem responsabilidade de ganhar o coração do que ainda não obedece à palavra, “sem palavra alguma, por meio do procedimento de sua esposa” (1Pedro 3.1).

O primeiro passo para qualquer restauração é reconhecer e abraçar a verdade. Somos pecadores salvos por Jesus, e o fato de estar no serviço do Rei dos Reis não apaga nem minimiza o fato óbvio de que somos pecadores, totalmente dependentes da graça e misericórdia de Deus. Este é seu caso; é também o meu – não sou nem um tiquinho melhor que você. As lutas de que você fala, eu já tive; às vezes ainda as tenho após quase 48 anos de casada. Portanto, não leia o que escrevo como “palavra de autoridade” de quem já chegou lá – veja apenas como compartilhamento de uma irmã mais velha ajudando outra irmã conforme Paulo escreve a Tito (2.4 e 5). De certa forma, é mais simples no caso da mulher do descrente: é orar por sua conversão. Mais complicado um pouco é o caso do marido que é crente, às vezes até líder na igreja, que trata mal a esposa (por isso Paulo fala que o presbítero não pode ser violento – tem tradução que usa a palavra “espancador”! (1Tm 3.8), e “que seja irrepreensível, não arrogante, não irascível, não violento… amigo do bem, sóbrio, justo, piedoso, que tenha domínio de si…” (Tt 1.6-8). O modelo para o marido crente, seja ele recém-casado apaixonado, seja ele de meia idade na chamada “idade do lobo” ou em plena “andropausa”, seja idoso temperante, respeitável, sensato, sadio na fé, no amor e na constância (Tt 2.2) – é amar como Cristo amou a igreja e se entregou por ela!

Só que Deus não deu a nós, mulheres, a incumbência de “mudar nosso marido”! Se até as mudanças em nós mesmas são tão doloridas, difíceis e somente pelo Espírito Santo através da lavagem da Palavra de Deus em nosso ser interior, como querer mudar o marido! Só podemos ser transformadas, pela Palavra, começando em nós – sabendo que Aquele que começou boa obra em nós há de completá-la até o dia de Cristo Jesus (Fp 1.6). Essa mudança em nós começa com mudança de atitude: Longe de nós toda ira e amargura. Hebreus 12.12-16 fala dos três aspectos de pecado que nos separam da graça de Deus: amargura, valores temporais errados e impureza moral. Além de mudar nossa atitude, haverá uma mudança de perspectiva: esperança em vez de desespero, confiança em vez de entregar-se à situação para “não balançar o barco”, ver do ponto de vista de Deus em vez do ponto de vista humano (Fp 2.13: porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade”). Isso gera uma mudança de ação: em vez de ser vítima passiva, a pessoa que está confiante no Senhor para sua transformação vai ser proativa, praticante da palavra e não somente ouvinte (Tg 1.22-25).

Temos exemplos no decorrer da história do povo de Deus de mulheres que agiram porque dependiam do Senhor: Débora, Rute, Abigail, Marta e Maria, a mulher Cananéia, Lídia, Priscila – você e eu. Você se lembra do “amigo importuno” que bate à porta à meia noite e insiste em pedir pão, na parábola de Jesus a respeito de insistir em oração? Junto a aguardar “sem palavra alguma”, a mulher cristã (como todo que qualquer pessoa que toma o nome de Cristo) tem também a responsabilidade de “falar a verdade em amor” (Ef 4.25) porque somos membros uns dos outros – e qual é o membro mais próximo do seu marido do que a mulher? Vocês dois têm de tratar juntos algumas questões. Uma amiga disse que quando perguntou “se ele estava disposto a rever algumas coisas, abrir mão, ele nem me ouviu usou de uma interpretação maldosa, me culpando, me acusando, que nem iniciei a conversa…” Tem de voltar a falar com ele, desta vez sem acusar, mas afirmando a sua própria disposição e necessidade de transformação. Não pode ser manipuladora, nem mesmo mencionando o que ele teria de errado (ele já sabe!) – apenas reitere que você quer mudar algumas coisas em você para que seu casamento espelhe o que Cristo quer, e que você conta com a ajuda dele, como sacerdote do seu lar. Abra o jogo, insista, falando a verdade em amor. Você não vai resolver ou controlar seu marido – só poderá tratar de você mesma. Os problemas de insensibilidade e egocentrismo dele, ele tem de ver e resolver coram deo (diante de Deus). Espero que ele se disponha a conversar com você sobre esses assuntos, a ouvi-la com a abnegação do amor que Cristo tem pela igreja. Muitos são os líderes ludibriados por Satanás, cegos a suas próprias carências e deficiências. Mas disso o Senhor tratará – o papel da esposa é ganhá-lo sem palavra alguma, pelo bom procedimento (1Pe 3.1-12).– e aguardar do Senhor as transformações que vão ocorrer a começar em você (A começar em mim/ quebra corações/ pra que sejamos todos um/como tu és em nós…)

Outro assunto que você menciona é a possibilidade das ações dele ser devido a Andropausa. (Por sinal, se você está em idade próxima à dele, talvez já tenha passado ou esteja passando pela menopausa [2]). Você diz que andou conversando com algumas amigas e pessoas da área da que lhe disseram que os sintomas (do seu marido) são da Andropausa. “Ele não tem mais a ereção, por conta disto, se sente menos homem (eu acho), fica nervoso, deve afetar a sua mente e sobra para nós esposas, meu sofrimento é grande, mais ele não aceita ir ao médico, diz logo que quem está doente sou eu.” Andropausa é um rótulo do nosso mundo psicologizado – não um diagnóstico preciso – mas a constatação de que há uma mudança no homem de meia idade que não está atento ao fato de que em diversas estações da vida há diversidade de ações, atitudes e sentimentos que nem ele, nem as pessoas que convivem com ele, entendem.

O fato desses sentimentos conflitantes surgirem e se multiplicarem na mesma época em que a pessoa deixa seu emprego regular em merecida aposentadoria só aumenta o problema. Tem o problema do valor e da valorização: muitas pessoas só obtinham sua valorização na profissão e na execução de uma atividade profissional remunerada. Com a aposentadoria, a remuneração continua, mas provavelmente também diminui, e as afirmativas (de outros ou de si para si mesmo) de que ele era insubstituível foram por água abaixo. Grande maioria das pessoas não se prepara para a aposentadoria; só pensam em não ter de bater o ponto, se esquecendo de pensar no que vão fazer pelos próximos vinte ou trinta anos da vida. Se não entendermos e abraçarmos a idéia bíblica de que nosso valor não está naquilo que temos nem no que fazemos, mas no Senhor a quem servimos, nosso sentimento de valor aumentará e diminuirá com as marés da vida.

O problema sexual, quer seja hormonal, quer por disfunção física ou psicológica, é apenas sintoma e alerta de que nem tudo vai bem no seu interior. O homem tem de entender que um bom exame físico é imprescindível, (um dos problemas comuns para disfunção erétil é câncer de próstata, por exemplo – todo homem com mais de 50 anos de idade deve fazer exame anual para detectar isso!) mas, mais que isso, um auto-exame interior. É muito mais importante que o casal enfrente os desafios junto. É fácil botar a culpa no outro: você que é fria e não me atrai mais, você não consegue, você é psicologicamente castradora – qualquer desculpa na verdade ignora o fato de que o problema é dos dois, pois os dois são uma só carne, membros um do outro, e quando um membro sofre, os dois padecem! Minha amiga disse: “tem sido terrível, pois sempre fui boa esposa, boa mãe, boa dona de casa e hoje vivo com um peso sobre mim, se não fosse a Graça de Deus na minha vida, nem sei, peço todos os dias sabedoria a Deus para continuar conduzindo meu casamento”.

Abra-se com ele e proponha que os dois busquem saber a origem das dificuldades, para que os dois “se tratem”. Sugiro que não vão pelo caminho da psicologia insubmissa ao senhorio de Cristo, mas procurem um casal de conselheiros maduros que conheçam profundamente a Palavra de Deus e vivam a prática da verdade em suas próprias vidas. Ele (e você) tem de ser confrontado com a verdade e encorajado a vivê-la em sua vida de perdas e ganhos.

Lembro-me de meu sogro, homem de Deus de extrema bondade e generosidade, quando ficava em casa “sem fazer nada” apoquentava em tom de brincadeira a minha sogra, indo para a cozinha por volta das 9:30 ou 10 horas da manhã, perguntando o que ela ia servir no almoço. Perdendo a função de autoridade ou administração, ele procurava alguma coisa em que podia mandar, ser melhor ou saber mais que sua mulher! Muitas vezes ela se irritava, mas a situação se tornava bem melhor quando ela o envolvia nos planos e nas ações que tinha de fazer. Certa época em que eu trabalhava fora enquanto meu marido estudava e tinha um horário mais “solto”, ele passou a me surpreender, preparando a janta e fazendo alguma tarefa doméstica que normalmente era minha. Jamais me esquecerei de sua sensibilidade autosacrificial.

Seu marido não conseguiria ser o sucesso que é sem a sua imprescindível ajuda – mas ele provavelmente tenha ilusão de que “conseguiu sozinho o que fez e o que tem”. “Tratar como filha” seria diminuir, tratar como criança? Porque o tratamento de filhos não pode ser de causar irritação ou ira (Ef 6.4). Mesmo que a mulher não tenha a mesma cultura, inteligência ou habilidade, ela tem o mesmo valor que ele diante de Deus.

Deus tratará dele – agora a questão é a mulher dele, que vê a corrida do tempo e os infindos afazeres minando suas forças. “Os que esperam no Senhor renovam suas forças; crescerão em vigor, subirão….” Concentre em renovar o seu coração, restaurar seus sentimentos, pedir ao Senhor que atente, que crie em você um novo coração. A cada dia, dez, vinte vezes, quantas vezes precisar! Trate seu coração pela lavagem da Palavra de Deus. Ainda estou aprendendo isso, e já criei os filhos, os netos já estão encaminhados, e Lau e eu temos um ao outro para amar e aprender a amar!

Você faz bem em “não falar tudo para os filhos porque cada um tem os seus problemas”; não deverá falar mal nem às amigas, nem mesmo (e especialmente não!) à sua mãe, se ela ainda for viva. “Falar a verdade em amor” implica em “não falar maledicência” por amor – temos de ser sábias quanto e com quem podemos nos abrir. A Deus, você deve falar sempre! A algum conselheiro/a comprovadamente sábio e bíblico, conforme a ocasião se abra. Aos filhos você deve falar sempre a verdade sem denigrir seu marido (ou outra pessoa) – sejam poucas suas palavras, pois a língua é fogo (Tg 3.6-11). Outra carta diz que ela (quem sabe ela é você!) procurou “não escrever palavras de mágoas ou me deixar levar por sentimentos feridos” enquanto as coisas não estivessem bem entre eles.. Reconheço que por mais que estejamos “bem”, sempre há lugar para melhor. Desconfio que talvez ainda não tenham resolvido entre vocês dois os sentimentos de defraude, pressão e cobranças. Trate seu coração, peça a Deus sabedoria e ocasião certa para tratar junto com seu marido, e regue tudo com o amor de Cristo.

Que sejamos bem-aventurados no que realizarmos, operosos praticantes (Tg 1.25). Que tenhamos o equilíbrio de “ganhar sem palavra alguma” junto a “falar a verdade em amor” seja a tônica de nossa vida, para a glória de Deus Pai!

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[1] O livro de Dave Harvey, Quando pecadores dizem sim,  ajuda a ver esse aspecto de como o pecado afeta nosso casamento.

[2] Um livro útil sobre o assunto é A mulher na crise da meia-idade, de Jim e Sally Conway, São Paulo: Cultura Cristã, 2001.

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Elizabeth GomesElizabeth tem bacharelado em teologia; é escritora, tradutora e palestrante. Elizabeth é casada com Wadislau Gomes e tem três filhos e sete netos, todos envolvidos no ministério pastoral: Davi, Daniel e Deborah, casada com John Deaton, com os filhos Mathew (17 anos), Timothy (15 anos) e Jonathan (quase 6 anos), residentes nos Estados Unidos, onde John é pastor.