Uma das coisas mais difíceis e mais contraculturais que Jesus nos chamou a fazer é amar nossos inimigos — fazer aos outros o que gostaríamos que eles fizessem a nós (Lucas 6.31). Somos chamados a tratar os outros da forma que gostaríamos de ser tratados, uma vez que a marca do amor verdadeiro é seu altruísmo — ele não age primeiramente em benefício próprio, mas sim visando o bem do outro. Com o intuito de se certificar de que entendem os como deve ser o amor verdadeiro, Jesus o contrasta com um tipo de amor fraudulento. Ele nos fornece três pequenas ilustrações de ações que podem ter aparência de amor, mas que são em essência apenas um tipo de troca na qual nós fazemos o bem pelos outros apenas para que eles façam o bem para nós. E me surpreende que as instruções de Jesus para nos relacionarmos com nossos inimigos sejam palavras que também precisamos ouvir para nos relacionarmos com nossos cônjuges. Muitas vezes “ame seu inimigo” significa na verdade “ame seu cônjuge”.

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A primeira ilustração é esta: “se você ama aqueles que o amam, qual o benefício disso para você?”. Não há nada de extraordinário em amar pessoas que nos amam. E, na verdade, essa é a base que se passa por amor em muitos relacionamentos. É a atitude do “uma mão lava a outra”. E o que realmente significa é “eu só o ajudo enquanto você me ajudar”. Enquanto a pessoa fizer o que é bom para você, você fará o que é bom para ela, mas, assim que ela parar de fazer o que é bom para você, você também irá parar que fazer o que é bom para ela. É óbvio que não há nada de especial nisso! Não é preciso seguir Jesus para se relacionar com alguém dessa forma. 

A segunda ilustração é esta: “se você faz o bem para aqueles que fazem o bem para você, qual o benefício disso para você?”. Não há nenhum! Por quê? Porque o benefício está vinculado à natureza de troca desse relacionamento. Se os outros fizerem o que é bom para você, você fará o que é bom para eles. Mas, novamente, se os outros pararem de fazer o que é bom para você, você irá parar de fazer o que é bom para eles! Isso é amor verdadeiro? Não; isso, na verdade, é amor próprio, pois sua premissa está na seguinte relação: você dará aos outros o que eles querem a fim de que você consiga o que quer. Trata-se apenas de encontrar um jeito para servir a si mesmo — e isso acontece mesmo no casamento.

A terceira ilustração é esta: “Se você doar para aqueles de quem você espera receber, qual é o mérito nisso?”. Você pode agir como se tivesse feito um grande ato de generosidade, mas não será nada generoso se você estava pensando mais no que poderia ganhar dessa troca do que no bem que poderia fazer à outra pessoa. Isso não é amor, mas ganância, pois se trata, em essência, de manter um registro das “trocas” da relação apenas para garantir que você sairá na frente. Todas essas são formas fraudulentas de amor, pois todas configuram um tipo de troca em que você ajuda os outros a fim de ajudar si mesmo. Isso significa que você não está realmente agindo com amor em relação à outra pessoa, mas apenas que está fazendo o necessário para que ela satisfaça seus desejos e “necessidades”. Você satisfará os desejos da outra pessoa apenas na medida em que ela satisfaça os seus. Isso não é amor de forma alguma, pois é direcionado para dentro em vez de para fora; pois é obcecado com o que se pode obter em vez do que se pode dar. Trata-se apenas de amor próprio.

E é aí que nós partimos para o casamento. Eu observo há muito tempo que a maior causa de conflito entre cônjuges é um fracasso em seguir o versículo “como quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles”. É um fracasso em amar altruisticamente. Nós podemos rapidamente deixar que nossos casamentos se tornem um tipo de relacionamento de troca, no qual em vez de pensarmos primeiro sobre o que podemos dar, pensamos primeiro no que podemos obter. Nós damos para poder receber de volta, e só damos proporcionalmente ao que recebemos. Nós calculamos tudo o que nosso cônjuge tem feito por nós e comparamos com o que nós temos feito por eles, e se torna difícil para nós quando o resultado da equação se torna favorável para eles. Mais uma vez, isso é apenas amor-próprio.

Mas se Jesus diz “ame seu inimigo” então com certeza ele diz “ame seu cônjuge”. Se ele o chama para amar seu inimigo de maneiras sacrificiais, então com certeza ele o chama para amar seu cônjuge de maneiras ainda mais sacrificais. Se ele o alerta para as tentações de responder seu inimigo com um tipo fraudulento de amor, você também precisa se atentar para seus alertas nas respostas que você dá à sua companhia mais querida. Se você precisa se doar sem fim, altruística e sacrificialmente, aos seus inimigos, quanto mais não deve se doar ao seu esposo ou à sua esposa?

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É pastor da igreja Grace Fellowship, em Toronto, no Canadá, editor do site de resenhas Discerning Reader e cofundador da Cruciform Press. Casado com Aileen e pai de três filhos, ele também é blogueiro, web designer e autor de várias obras.

Tradução: Rebeca Falavinha | Revisão: Rebeca Gueiros

https://www.challies.com/articles/sometimes-love-your-enemy-means-love-your-spouse/