gatekeepersO que você quer dizer com Guardiões? Nos tempos bíblicos, as cidades eram frequentemente protegidas contra inimigos por altas e fortes muralhas. Os portões eram a única entrada para a cidade, então os guardiões eram indicados para controlar quem entrava e saía pelos portões da cidade. Os portões também serviam como o mercado público, côrte de justiça, centro administrativo, e forum público. Os guardiões então controlavam o acesso ao centro social, político e econômico da cidade. Imagine o quanto um guardião aprendia só observando as atividades diárias ao redor do portão, e quão influente ele poderia ser nessas áreas da sociedade.

ENCORAJANDO NOSSOS FILHOS A SEREM GUARDIÕES

A Bíblia nos fornece muitos exemplos de jovens que eram chamados a servirem ao Senhor em posições de guardião. Esses guardiões influenciavam o bem estar social, político e econômico de Israel. Ademais, Deus apontava esses guardiões para destruir o mal, promover o bem e ser uma bênção para o povo. Pense em José, Moisés, Davi, Obadias, Ezequias, Josias, Ester, Neemias e Daniel. Esses jovens ascenderam à preeminência como guardiões e trabalharam duro para mudar a sociedade em que eles viviam.

À luz desses inúmeros influentes personagens, como nós podemos encorajar os nossos filhos a serem influentes guardiões? Nós aconselhamos muitos dos nossos filhos a serem pastores, professores, médicos ou enfermeiros. E essas posições são importantes. Mas e quanto a encorajá-los a servirem como líderes políticos, advogados e jornalistas? Nós ouvimos objeções a essas posições. Alguns dizem, “Como um cristão verdadeiro pode ser um político, advogado ou jornalista?” Essas vocações exigem engano, exploração e corrupção de mente.” Enquanto muitos nessas profissões cooperam para essa visão negativa, será que a Bíblia também nos desencoraja a servir nessas posições?

Considere os líderes ímpios do Antigo Testamento como o rei Acabe e a rainha Jezebel, que instituiu o culto a Baal e assassinou os profetas de Deus. Ou o Rei Assuero, que ordenou o genocídio dos judeus. Neemias enfrentou perseguição dos governantes ao seu redor. Os reis da Babilônia eram extremamente orgulhosos e duros. Eles tinham pouca consideração por vidas. No meio de reinos e governantes tão maus, os guardiões do Senhor influenciaram reis, governadores  e pessoas. Não há suporte bíblico para dizermos aos nossos filhos que fiquem fora dessas áreas de influência.

A influência cristã nessas áreas hoje é mínima. Algo tem contribuído para que os nossos filhos não busquem essas profissões. Talvez os crentes tenham se acomodado e relaxado, pensando que o seu país era uma nação cristã. Ou talvez os riscos de servir nessas posições de guardião foram considerados grandes demais, ou as responsabilidades não foram suficientemente enfatizadas. Seja qual for o motivo para essa falta, os incrédulos viram as oportunidades e trabalharam para que o seu povo assumisse posições chaves. Alguns grupos tabalharam para minimizar os determinantes morais da nossa pátria através das côrtes, advogados e juízes. Ativistas homossexuais começaram a dominar a mídia, usando suas posições de guardiões para implementar as mudanças que desejavam. Enquanto a igreja cristã estava dormindo, aqueles com uma agenda ímpia para o nosso país e sociedade não estavam. Agora muitos cristãos estão acordando para a realidade de que a nossa nação foi cortada de suas raízes cristãs, e suas posições influentes foram usurpadas por líderes incrédulos. Nós temos que entender que um governo corrupto não é desculpa para que os servos do Senhor deixem de encorajar os seus filhos a se tornarem guardiões.

Frequentemente nós citamos textos como “Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo (Filipenses 3:20), e aplicamos de forma equivocada que isso significa que um crente deve ser totalmente isolado desse mundo. É bem verdade que o evangelho liberal social não pode trazer o céu à terra. Também é verdade que se nós olharmos o mundo como dois reinos distintos, nós certamente deveremos as vezes iremos colocar nossa sorte no reino celestial e negligenciaremos o terreno. Ainda assim, para se ter uma influência cristã duradoura no mundo, nós temos que treinar nossos filhos a serem guardiões na vida política, social e na imprensa da nossa cultura. Como nós fazemos isso? Aqui estão oito diretrizes para nos auxiliar.

O QUE NÓS DEVEMOS CULTIVAR

1. Nós temos que cultivar as virtudes da verdade, bondade e beleza nas nossas crianças

Desde os tempos antigos, as virtudes da verdade, bondade e beleza têm dominado o trabalho dos poetas, escritores, filósofos, artistas e políticos. Até pouco tempo atrás, muitos líderes também buscavam cultivar essas virtudes em seus trabalhos. Contudo, a cultura de hoje tem redefinido essas virtudes. O antigo provérbio que dizia “A beleza está nos olhos de quem vê”, agora se aplica à verdade, que tem sido relativizada e pluralizada para se encaixar a preferências individuais. E bondade tem se tornado nada mais que eufemismo e cliché.

Não crentes geralmente apresentam uma visão rasa de virtudes. Pense no rei Assuero e sua visão de beleza. Ele retirou uma rainha e colocou outra no lugar baseado nesse aspecto superficial. Ele era impulsivo e precipitado em suas decisões e não considerava a perspectiva divina de verdade, bondade ou beleza. Quando essas três virtudes são redefinidas para se acomodar a gendas e filosofias pessoais, fica difícil manter a integridade de coração ao trabalhar na esfera pública. Essas virtudes deixam de existir para melhorar a humanidade ou a sociedade quando elas são usadas para promover objetivos pessoais e glorificar o indivíduo.

Apesar dos erros dos nossos dias, é fundamental que eduquemos os nossos filhos a terem verdadeiro entendimento sobre verdade, bondade e beleza. Agostinho escreveu “Toda verdade é verdade de Deus.” Apesar de ser uma frase simples, é também muito profunda. O que Agostinho ( e mais tarde os Reformadores) queria dizer com essa frase era que o que que que seja verdade, Deus o é.  (whatever truth is, God is). Toda verdade deriva sua existência de Deus. R.C. Sproul explica dessa maneira: “Toda verdade é verdade de Deus, e toda verdade se encontra no topo.”Assim, seja a verdade encontrada na ciência social, matemática, ciência propriamente dita, filosofia ou política, depende primeiro se vem de Deus. Deus criou um universo coerente, consistente e sistemático. A implicação prática disso é que independentemente da vocação, a verdade, bondade e beleza então presentes a deveriam ser descobertas, discernidas e defendidas. Isso nós vimos na rainha Ester. Apesar de ter sido estimada pela sua beleza exterior, sua dedicação interna à verdade, bondade e beleza pesavam muito mais que a sua aparência externa.

Nós precisamos ensinar o valor dessas virtudes aos nossos filhos. No que quer que eles se empenhem a fazer, eles ou estarão aprendendo ou reprovando a verdade. O que quer que eles defendam, eles estarão defendendo ou trazendo descrédito à verdade. Mas nós também precisamos ser consistentes em ensinar os nossos filhos que apenas as Escrituras definem verdade, bondade e deleza. Essas virtudes não podem ser princípios abstratos ou preferências pessoais, mas devem ser definidos em conformidade com os padrões bíblicos.

2. Ensine a eles que apenas o que for feito para Cristo irá durar

Nós queremos que os nossos filhos saibam disso independentemente da profissão que eles escolham. Esse também é um bom princípio para os nosso filhos lembrarem quando eles estiverem entrando na esfera pública da política, economia ou jornalismo. Muitos que entram nessas profissões buscam promover suas próprias agendas. Seja pressionando suas próprias ideologias, acumulando riquezas materiais, ou se tornando conhecidos, eles buscam realizar o trabalho pra construirem um nome para si. (cf. Gn 11)

Obadias denunciou Edom por tamanha soberba, dizendo:”proque o Dia do Senhor está prestes a vir sobre todas as nações; como tu fizeste, assim s e fará contigo; o teu malfeito tornará sobre a tua cabeça (Ob 15). No dia do julgamento, as obras dos homens maus virão sobre eles. Aqueles que buscavam ganho próprio promovendo suas agendas e lutando para serem famosos serão completamente destruídos pelo Senhor. Quando nossas obras são feitas para nossos próprios fins, destruição é um fim inevitável. (cf. Ec 12:13-14).

A cosmovisão cristã ensina algo completamente diferente. Diz que um político, economista ou jornalista cristão deve ser diferente por conta da mensagem que carrega. Ao invés de prmover sua própria agenda, o cristão sabe que ele existe para fazer Deus conhecido, e para glorificá-lo em todas as áreas de sua vida (veja Sl 105:1; Mt 10:32). O político cristão deveria promover uma agenda que glorifique a Deus, mesmo que lhe custe votos, diminua sua popularidade ou que seja taxado como divisionista. O cirstão economista deve ter ser olhos firmados primeiramente nos tesouros nos céus (Mt 6:20), encorajar um testemunho sábio dos recursos materiais, ensinar como evitar o peso de uma dívida e promover princípios provindos das Escrituras. O cristão jornalista deveria se preocupar em narrar os eventos, atividades ou entrevistas de forma justa, caridosa e verdadeira. Ele não deve procurar sujar a imagem pública de alguém, mas apresentar a pessoa e os fatos de forma verdadeira (Lc 6:31).

Finalmente, nós precisamos ensinar os nossos filhos a estarem envolvidos na obra do Senhor, e mostrar a eles que no fim das contas só o trabalho que eles fazem para Cristo será lembrado e contado no Dia do Juízo (veja 1Co 3:13). Aqueles que constroem suas vocações sobre qualquer outra fundação que não Cristo, irão colher apenas julgamento. É essencial que as nossas crianças trabalhem como ao Senhor (Cl 3:23-24).

Alguns podem questionar esse ponto, dizendo que o que nós fazemos de segunda a sexta tem muito pouco a ver com o tipo de adorador que nós somos no domingo. A ênfase do nosso país em separar Igreja e Estado é uma desculpa que muitos usam para não serem políticos, economistas e jornalistas piedosos. Mas as Escrituras não nos ensinam esse tipo de compartimentalização. Na tarefa dos nossos filhos, no trabalho de meio expediente, na vocação secular, na escola dominical, ou na escola, Deus deve ser o Senhor sobre todas as coisas. Paulo nos dá esse princípio quando diz “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra cousa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus” (1Co 10:31). Apenas o trabalho que é feito pelo nome de Cristo terá valor.

3. Ensine a eles que o temor do Senhor é supremo

Ensine seus filhos um amor por Cristo que estimula um temor a Deus e não a homens. Esse temor a Deus é diferente, não escravo, mas filial, como de uma criança, buscando a aprovação de Deus em amor. Mesmo bons políticos, economistas e jornalistas são frequentemente guiados por temor de homens. Seja quando políticos defendem certa legislação porque temem que a sua carreira esteja em jogo; ou economistas que reportam o estatus financeiro da nação temendo que os cortes necessários sejam duros demais para o povo suportar; ou jornalistas embelezando, distorcendo, ou relutantemente apontando a verdade por medo de ser criticado pela mídia ou de não ter a matéria de capa; o medo de homens direciona muito o que eles vão fazer. Nós devemos incutir em nossos filhos um amor por Cristo que estimule um temor a Deus e não a homens  (veja Lc 12:5) de modo que o sorriso ou reprovação de Deus pesem mais que o dos homens.

Pense em Neemias. Como ele tentou reconstruir as muralhas de Jerusalém, ele e seus trabalhadores sofreram muita perseguição daqueles que estavam ao redor deles. Eles perseveraram mesmo com as ameaças dos governadores e judeus rebeldes. Ele permaneceu firme no trabalho do Senhor com enorme dedicação. Daniel é outro grande exemplo. Ele sabia do decreto que o proibia de orar a qualquer outro senão ao rei, mas ainda assim ele não hesitou em permancer diligente em suas orações ao Senhor. Perceba como Deus usou poderosamente esses dois homens. Eventualmente essa dedicação e temor a Deus trouxe a eles respeito diante dos líderes terrenos. Neemias era estimado aos olhos do rei e Nabucodonosor emitiu um segundo decreto para adorar o Deus de Daniel. Deus trabalha através do seu povo ainda que eles sirvam a um governo mau.

Nós precisamos educar nossos filhos com tal integridade e fidelidade partidária a Deus que o louvor de homens não é nada diante da aprovação de Deus. Imagine quão diferente a política, economia ou jornalismo seriam se fossem guiados pela agenda de homens e mulheres que temem a Deus acima de qualquer coisa. Nossa cultura seria significativamente diferente. Nossa cultura seria mais consistente. As pessoas teriam mais fé naqueles que governam, ajudam e escrevem por nós. Imaginem a influência de uma cultura onde o temor a Deus é a base de tudo o que cremos. Nossa cultura precisa de homens e mulheres que não temem a face de homem nem a opinião de pessoas, mas que acreditam somente em Deus.

4. Ensine aos nossos filhos que trabalhar é um presente de Deus

Nossas filhos precisam aprender a ver o trabalho como um presente de Deus à humanidade. Quando Adão e Eva foram colocados no Eden, eles foram ditos a cultivarem o jardim (Gn 2:15). Deus ordenou que o homem deveria ter domínio sobre a terra sujeitando-a a si mesmo pelo trabalho. Trabalho como um presente de Deus não é a forma como enxergamos o trabalho hoje. Nós vemos como algo cansativo, pesado e mundano. Essa mentalidade nos leva a querer trabalhar o mínimo possível  e a receber o máximo possível. Nós procuramos atalhos ou falhamos em fazer o nosso melhor. Divisão de lucros,  férias e outros benefícios se tornam o nosso padrão de bom emprego. Nós precisamos remodelar essa imagem de trabalho de forma que os nossos filhos possam vê-lo com algo digno de vocação. Eles precisam ver as suas futuras férias como oportunidades de usarem os dons que Deus deu a eles e de fazer Cristo conhecido em tudo que fazem.

Quando Paulo comissionou Timóteo a pregar o evangelho, ele disse: “reavives o dom de Deus que há em ti” (2 Tm 1:6). As Escrituras nos ensinam que Deus nos deu talentos diferentes. Nosso objetivo é ajudarmos os nossos filhos a reconhecerem esses dons e a usá-los em suas vocações  que irá reavivar essas graças. Nós não devemos impor nossas esperanças, desejos e aspirações ou sonhos sobre eles. Além disso, nós não devemos encorajá-los a seguir o caminho da nossa cultura de simplesmente tentar achar um emprego que te pague bem e ofereça bons benefícios. Nossos filhos precisam usar os seus dons para glorificar a Deus. Nós precisamos agir de forma intencional a auxiliar uns filhos a desenvolverem seus dons de administração, matemática ou contabilidade, enquanto guiamos outros a seus escritos e abilidade de editar textos. Fazendo isso, nós estaremos cultivando nossos filhos para entrarem no mundo público de trabalho.

Quando a rainha Ester estava duvidando se deveria ou não se aproximar do rei, seu tio Mordecai sabiamente perguntou: “e quem sabe se para conjuntura como esta é que foste elevada a rainha?”(Ester 4:14). Mordecai reconheceu que o Senhor tinha colocado a sua sobrinha naquela específica posição de rainha para que ela pudesse se aproximar do rei e intercedesse por seu povo. Ester não desprezou sua esfera de influência dada por Deus mas a usou pra para salvar os judeus de grande genocídio. Ela é um bom exemplo de como reavivar os dons de Deus dentro de si.

                                                                                                                    Continua…

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joel beeke*Esse artigo foi originalmente publicado na revista The Banner of Sovereign Grace Truth (Edição online de Janeiro/2013) , traduzido com permissão do autor.

**Dr. Joel Beeke é presidente e professor de teologia sistemática no Puritan Reformed Theological Seminary (EUA). É pastor da Heritage Netherlands Reformed Congregation, editor da Banner of Sovereign Grace Truth, diretor editorial de Reformation Heritage Books, presidente da Inheritance. Foi co-autor, escreveu ou editou mais de 50 livros, dentre os quais, “Vivendo para a Glória de Deus” e “Vencendo o Mundo”. Obteve seu Ph.D. em Teologia da Reforma e Pós-reforma no Westminster Theological Seminary. Ele é convidado freqüentemente para lecionar em seminários e pregar em conferências ao redor do mundo. Ele e sua esposa, Mary, foram abençoados com três filhos: Calvin, Esther e Lydia.

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*** Tradução: Roberta Macedo