Jefte parte 3

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5. Honre ao Senhor

O mais profundo e mais alto passo para uma verdadeira submissão é honrar ao Senhor dizendo,”A glória do Senhor é maior que eu mesma e que a minha salvação” Este é o ponto em que a filha de Jefté se destaca. Ela era tão submissa que poderia renunciar a qualquer coisa para não ver o nome do Senhor ser difamado.

A glória do Senhor significava mais para ela do que sua própria vida. É como se ela estivesse dizendo:  Pai, cumpre o que prometeste, porque a gloria do Senhor está em jogo. O meu futuro nada significa comparado com honrar ao Senhor. Eu abro mão de tudo pra que a Tua reputação seja preservada.

A filha de Jefté  se identificou tanto com a causa de seu pai, que era a causa do fiel Deus de Israel, que ela era espiritualmente uma com o seu pai.  A volta dele em segurança encheu-a de alegria.

O problema do povo de Deus estava em seu coração e ela estava disposta a fazer qualquer sacrifício que o Senhor a pedisse, desde que o povo de Deus triunfasse. Jefté rasgou suas vestes e ficou abalado ao ver sua filha, porém ,ela se alegrou e  se manteve firme na fé pois o Senhor havia lembrado a Sua aliança e vindicado a causa do Seu povo. Ela sem dúvida derramou muitas lágrimas enquanto seu pai estava batalhando contra os Amonitas, mas agora que ele estava em casa ela estava cheia de alegria.

Honrar ao Senhor a fez esquecer-se dela mesma. Ela sabia que a maior meta e conquista dessa vida era honrar a Deus concordando inteiramente com a Sua vontade. Que belíssimo exercício de autonegação ela experimentou.

Somos muito pobres no que diz respeito à autonegação nos dias de hoje. Nós mal sabemos o que isso significa, muito menos experimentamos a alegria de poder exercitar isso. Nós não conseguimos compreender que sem a autonegação nós podemos vir até a ter tudo, mas não teremos um pingo de felicidade. Não é atoa que a nossa vida não contagia as outras pessoas! Quão importante é a dimensão sacrifical da verdadeira piedade. Para Calvino, autonegação significava compreender que não somos donos de nós mesmos , pertencemos a Deus. Isso significa desejar que a nossa vida esteja completamente focada em n’Ele, rendendo tudo o que somos como um sacrifício vivo. Portanto, o que quer que Deus faça conosco é bom, porque essa é a Sua vontade.

Uma irmã de nossa  igreja havia marcado uma cirurgia de grande porte recentemente, pouco antes dela ser levada para a sala de operação eu perguntei pra ela “Como você está?” Ela apertou minha mão e disse com confiança: “ Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer pois vivamos ou morramos, somos do Senhor.” (Rm 14:8)

Que lindo testemunho de como a graça pode triunfar em nossas almas! Foi isso que a filha de Jefté experimentou. Ela se curvou amorosamente junto com seu pai sob a soberania de Deus, com condescendência e um santo esquecimento de si mesma. Deus significava muito mais pra ela do que seu próprio futuro. Ela não discutiu ou argumentou com Deus, a paz que excede todo entendimento transbordava dentro dela. Ela estava tão cheia de Deus que o diabo não poderia abalá-la, ela alegremente tomou a sua cruz e seguiu o Senhor.

Jonanthan Edwards disse uma vez “ Os melhores momentos da minha vida não foram os relacionados à minha própria salvação, mas sim, aqueles em que eu fui levado à comunhão com Deus, e pude ver Sua beleza e desejar a Sua glória…eu me alegro e anseio por ser esvaziado e ter o meu “eu” aniquilado em favor de ser preenchido somente com a glória de Deus e de Cristo.” Semelhantemente, a filha de Jefté  por amor à causa de Deus, se regozijou em meio a sua própria calamidade e seus sonhos frustrados.

Quais são os seus anseios e sonhos pro futuro? O que você tem buscado? Você desistiria disso pelo Senhor e pela reputação d’Ele? Por conta do voto de seu pai, a filha de Jefté nunca poderia  sentir a alegria da maternidade, ela teria que desistir de qualquer desejo de propagação da linhagem que poderia vir a nascer o Messias.

Jefté também sentiu a dor dessa perda. Cumprir seu voto significava que a continuação de sua família terminaria e ele nunca teria um lugar na linhagem do Messias. Nós podemos sentir a angustia de Jefté no versículo 35, quando ele rasga as suas vestes e clama, “Ah! Minha filha, tu me prostras por completo.”  Ele estava disposto a oferecer qualquer coisa em sua casa para servir ao Senhor, mas precisava ser sua única filha?

Você pode imaginar essa perda? Você prometeu lealdade a Cristo, você prometeu que iria a qualquer lugar para servi-Lo, mas precisa ser justamente naquele lugar?  Você faria qualquer coisa por Ele, mas precisa ser logo isso?  Você poderia sacrificar qualquer coisa, mas tem que ser aquilo?

A maior preocupação da filha de Jefté era honrar a Deus e a fidelidade de seu pai para com a Sua palavra. Ela estava disposta a sacrificar todos os seus sonhos para servir a Deus em gratidão pela salvação que Ele proveu ao povo contra os Amonitas.  Você está disposta a fazer um sacrifício como este?

A influência de uma inspiradora submissão

Então, você pode perceber que a real questão não é quantas aflições nós temos experimentado, mas que essas dores nos levam a uma doce submissão diante de Deus quando rendemos tudo a Ele. Você sacrificaria suas expectativas e seus sonhos mais amados se Deus os pedisse?  A filha de Jefté fez isso, e deixou um exemplo para as outras garotas israelitas que vieram depois dela. A boa vontade dessa jovem mulher em abrir mão de um casamento, e de relações sexuais em submissão a seu pai e à providencia do Senhor era contagiante; sucessivas gerações de jovens israelitas olharam pra ela como um exemplo inspirador. Pela graça do Espírito, ela inspirou muitas a se dedicarem ao serviço do Senhor.

Se Deus nos santifica, nós seremos mais influentes para os outros quando estivermos mais afligidos. As pessoas irão olhar para nós mais de perto para ver se e como a fé nos sustenta.

David Livingstone, o grande missionário, lingüista e que participava da campanha contra a escravidão, é um notável exemplo de uma vida cristã que contagia. Quando Livingstone era um garotinho, ele tinha um amigo muito próximo. Eles dois gastavam muito tempo juntos e durante esse período, David foi salvo, mas seu amigo não. David tentou ao máximo convencer seu amigo a se voltar para Cristo. Ele sabia que a melhor maneira de se viver era sacrificar a tudo por Cristo, mas seu amigo estava convencido de que o caminho pra se viver era buscar por dinheiro e ter o prazer e o lazer que vem junto com isso.

Livingstone foi pra Africa em submissão sacrificial ao evangelho e à glória de Deus. Suas jornadas para alcançar o inalcançável através do evangelho o levaram a milhares de quilômetros a pé para remotas vilas africanas, onde nenhum branco havia estado antes. Aonde quer que ele fosse ele pregava.

Quando Livingstone morreu na Zâmbia aos seus 60 anos, seus amigos próximos enterraram seu coração lá, enquanto o seu corpo embalsamado foi trazido pra Inglaterra, onde foi dado a ele um funeral de Estado na abadia de Westminster. Milhares de pessoas foram às ruas para prestar homenagem a esse grande missionário e explorador.

Uma pessoa na multidão ouviu um homem com roupas esfarrapadas murmurando baixinho enquanto o carro fúnebre passava: “Você estava certo Davey, você estava certo”

Depois que a procissão terminou, o observador perguntou ao homem vestido de trapos: “ O que você quis dizer, ao falar: ‘Você estava certo, Davey’”?

Eu e David estudamos juntos, o homem disse. Ele tentou me convencer a desistir de tudo por Cristo. Eu recusei porque eu tinha certeza de que poderia ter uma vida muito melhor se eu possuísse dinheiro. Eu gastei minha vida no mundo dos negócios e algumas vezes perdi tudo. E ele tinha tudo porque ele tinha a Deus e estava disposto a entregar sua vida por uma causa maior que ele mesmo.

Você está convencido de que David estava certo? Você vai pedir a Deus por graça para ser um cristão cuja submissão sacrificial influencia as pessoas, como a filha de Jefté  e David Livingstone?  Então você pode me dizer “Tudo isso parece impossível pra mim, você colocou um padrão muito alto”.

O padrão está alto, por duas razões. Primeiro, muitos de nós hoje em dia, que professamos a Cristo nos acostumamos com padrões muito baixos. Nos acostumamos com a mediocridade. Nós vivemos muito abaixo de nossos privilégios como cristãos. Os velocistas do mundo esforçam-se por exelencia enquanto correm sua carreira, mas nós cristãos muitas vezes ficamos à margem, raramente deixamos alguém impressionado com nossa vida cristã e pouquíssimas vezes testemunhamos pra alguém a alegria de conhecer Jesus Cristo. Que vergonha de nós mesmos por fazermos do evangelho algo tão banal, tão medíocre e tão desagradável.

A segunda razão por deixar o padrão alto é que Deus pode te dar a graça de viver esse caminho por conta do Seu filho, que é o supremo e perfeito exemplo de submissão sacrificial. Mesmo quando Jesus tinha vinte anos, ele já vivia ocupado com as coisas de seu Pai. (Lucas 2:49) Ele sempre viveu coram deo , sempre defendeu o Pai, sempre aprovado por seu Pai, sempre agarrado a seu Pai e sempre honrando seu Pai. Mesmo na noite escura de sua alma, Jesus clamou por Deus do mais profundo do seu ser: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Vamos aprender com quem era manso e humilde por amor a nós, e então nós, por  graça poderemos viver influenciando pessoas com nossa vida de submissão sacrificial

Nós não teremos vidas perfeitas. Nós  podemos tropeçar algumas vezes. Mas pela graça do Santo Espírito e pelo amor de Cristo, nós podemos viver contagiando pessoas. E nós podemos testificar pra nós mesmos e para os outros que o único caminho pra se viver, o caminho pra se viver com um propósito,o alegre caminho pra se viver é viver contagiosamente pra glória de Deus, em Cristo, pela fé através da graça. Soli Deo Gloria!

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joel beeke*Esse artigo é parte do primeiro capítulo do livro “Contagious Christian Living” (Vida Cristã Contagiante)  da Reformation Heritage Books and Pryntirion Press traduzido com permissão do autor.
ps. Para quem lê em Inglês e se interessou pelo livro, o site da editora aceita cartão de crédito brasileiro e envia para o Brasil.

**Dr. Joel Beeke é presidente e professor de teologia sistemática no Puritan Reformed Theological Seminary (EUA). É pastor da Heritage Netherlands Reformed Congregation, editor da Banner of Sovereign Grace Truth, diretor editorial de Reformation Heritage Books, presidente da Inheritance. Foi co-autor, escreveu ou editou mais de 50 livros, dentre os quais, “Vivendo para a Glória de Deus” e “Vencendo o Mundo”. Obteve seu Ph.D. em Teologia da Reforma e Pós-reforma no Westminster Theological Seminary. Ele é convidado freqüentemente para lecionar em seminários e pregar em conferências ao redor do mundo. Ele e sua esposa, Mary, foram abençoados com três filhos: Calvin, Esther e Lydia.

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*** Tradução: Rebecca Figueiredo