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“Ouve, filho meu, e sê sábio; guia retamente no caminho o teu coração”. – PROVÉRBIOS 23:19

Por anos nós cuidamos de nossas crianças como pássaros cuidam de seus filhotes.Nós as protegemos do perigo, trazemos coisas boas para comerem e atendemos a todas as suas necessidades. Contudo, todo pai e mãe enfrentarão o dia em que seus preciosos filhos sairão do ninho e voarão por conta própria. Eles já não mais permanecerão debaixo de nossas asas. Eles seguirão as suas próprias crenças e desejos. O mundo inteiro estará diante deles e eles tomarão incontáveis decisões sobre trabalho, casamento, filhos, igreja, política e vida pessoal. Enquanto você torce para que ainda tenha voz na vida deles como um amigo e conselheiro confiável, você nunca voltará aos tempos em que pegava o seu bebê e o colocava no berço para mantê-lo seguro. Você ficará na porta, observando-o afastar-se para viver sua própria vida.
Portanto, nada é mais essencial à tarefa de educar seus filhos “na disciplina e na admoestação do Senhor” (Ef 6:4) do que inculcando fortes convicções neles. Pais cristãos deveriam se esforçar para prover a cada filho uma bússola bíblica interna que os guiará por toda a vida. Claro, devemos reconhecer nossas limitações. Nossas crianças não são robôs, que podemos programar para seguir cada diretriz. Nem deveríamos tentar usurpar o lugar de Deus, o único que pode dar aos nossos filhos corações novos e colocar seu espírito neles, de modo que prontamente farão tudo o que ele mandar. Contudo, os pais tem uma oportunidade única de cultivar em seus filhos as convicções básicas que os guiarão pelas oportunidades e perigos da vida. O livro de Provérbios fornece muitas instruções sobre como criar nossos filhos.
Provérbios 23:12 diz, “Aplica o coração ao ensino e os ouvidos às palavras do conhecimento”. Note que primeiro de tudo, Salomão se dirige aos pais que ensinam suas crianças. Eles próprios devem ser instruídos, buscando “a sabedoria lá do alto” (Tg 3:17), e se atentando “às palavras do conhecimento” encontradas na Palavra de Deus. Note também que desse versículo ao final do capítulo, a palavra “coração” aparece não menos que sete vezes. Por exemplo, no versículo 19 um pai exorta seu filho “Ouve, filho meu, e sê sábio; guia retamente no caminho o teu coração”. Dar ouvidos à instrução paternal da Palavra de Deus fará a criança “sábia para a salvação”
(2 Tm 3:15), capacitando-a a guiar o seu coração no caminho “que conduz para a vida” (Mt 7:14). Do coração procedem “as fontes da vida” (Pv 4:23).
Tedd Tripp escreveu, “esse entendimento opera coisas maravilhosas na disciplina. Ele faz do coração a questão a ser discutida, não apenas o comportamento. Ele foca a correção em coisas mais profundas que apenas mudança de comportamento. O ponto de confrontação é o que está acontecendo com o coração. A sua preocupação é desmascarar o pecado do seu filho, ajudando-o a entender como isso reflete o coração desviado. Isso leva à cruz de Cristo. Isso ressalta a necessidade de um Salvador, cria oportunidades para mostrar a glória de Deus, que enviou o seu filho para mudar os corações e libertar as pessoas escravas do pecado”.
A última coisa que pais cristãos deveriam querer para seus filhos é que eles se tornem pequenos fariseus, limpos por fora, mas podres e mortos por dentro. É importante enfatizar não apenas o comportamento externo, mas também suas consciências, mentes e corações. Nosso alvo deve ser treinar o íntimo dos nossos filhos, informando suas mentes e moldando suas consciências de modo que se o Espírito de Deus abençoar nossos filhos com a graça salvífica, eles viverão pela fé no Filho de Deus e caminharão em obediência fiel aos mandamentos de Deus. Quando nossos filhos são pequenos, nós podemos simplesmente dizer-lhes o que fazer. Contudo, desde cedo
devemos também associar a aplicação das regras com instrução, e instrução com perguntas, e perguntas com conversas. Nós devemos cuidar disso, para que eles saibam o que fazer, como fazer e por que isso importa.
Como podemos inculcar convicções cristãs em nossas crianças? A última parte de Provérbios 23 nos dá muita informação sobre como fazer isso. Vou resumir seus ensinamentos em seis princípios.
Princípio #1: Inculque convicções disciplinando com misericórdia.
Embora possa surpreender muitas pessoas hoje, parte do plano amoroso de Deus para treinar crianças pequenas a dirigirem seus corações com sabedoria é batendo nelas quando necessário. Provérbios 23:13-14 diz, “Não retires da criança a disciplina,
pois, se a fustigares com a vara, não morrerá. Tu a fustigarás com a vara e livrarás a sua alma do inferno.” A vara da correção deve ser usada, não para machucar o corpo, e certamente não para dar à criança o que o seu pecado merece, mas apenas para frear a sua tendência natural de escolher o mal e rejeitar o bem.
Aplicar a disciplina corporal é um dos aspectos mais desagradáveis de liderar uma família de modo cristão. Algumas pessoas igualam bater com raiva ou abuso, mas todos os cristãos devem lembrar que “a ira do homem não produz a justiça de Deus” (Tg 1:20). A vara da ira não é o mesmo que a vara da correção. Disciplina paternal deve se conformar ao exemplo de nosso Pai no céu: “Porque o SENHOR repreende a quem ama, assim como o pai, ao filho a quem quer bem” (Pv 3:12). O motivo é o amor, não a raiva; o modo é paternal, não judicial; o objetivo é a correção, não a punição (Hb 12:5-14).
A disciplina pode dar errada se você não tiver claro em sua mente que você está agindo no lugar de Deus. Caso contrário, a tendência será disciplinar a criança baseado nas suas emoções ou aborrecimentos pessoais e não nas ordenanças de Deus. Disciplinas injustas ou egoístas podem apenas provocar a ira dos filhos e diminuir a consideração deles por você. Se você perder o controle e começar a gritar,
você rapidamente esquecerá de todo o propósito da disciplina cristã. Nunca esqueça que quando você disciplina, você está disciplinando no nome de Deus. Ele colocou a vara da correção na sua mão e você é um administrador dessa vara em favor dele. Como representante de Deus, você deve administrar a disciplina com:
1.Amor:
“Filho meu, não rejeites a disciplina do SENHOR, nem te enfades da sua repreensão. Porque o SENHOR repreende a quem ama, assim como o pai, ao filho a quem quer bem”, diz Provérbios 3:11-12. Disciplinar sem amor mostra a suas crianças a imagem do diabo, não a de Deus. Quando o diabo nos aflige, o seu objetivo é nos amargurar contra Deus e nos trazer destruição. Quando Deus nos pune, o seu intento é nos tornar participantes de sua santidade e retidão (Hb 12:10-11).
2.Instrução:
Cristo diz, “Eu repreendo e disciplino a quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te… Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às
igrejas” (Ap 3:19,22). Combine a repreensão e o castigo com uma explicação sobre o mal feito, enfatize o que é o arrependimento e o quanto a graça demonstrada por Cristo àqueles que abandonam seus pecados é gratuita e garantida, para que a mente e a consciência dos seus filhos possam repercutir com a justiça e a bondade do que você fez. Essa é uma razão pela qual bater deveria aplicar-se apenas quando uma criança é grande o suficiente para entender o ensinamento. Leve a criança a um quarto privado, explique o mal que ela fez e por que você precisa bater nela. Depois, abrace a criança e ore com ela. E então considere a questão resolvida. Não a traga de volta. Como Spurgeon brincou, quando você enterra um cachorro, você não deixa o rabo dele pra cima, aparecendo na grama.
3. Compaixão: Salmos 103:13-14 diz, “Como um pai se compadece de seus filhos, assim o SENHOR se compadece dos que o temem. Pois ele conhece a nossa estrutura e sabe que somos pó.” Associe-se à experiência do seu filho. Relembre o poder da tentação e a teimosia do coração humano. Identifique-se com ele como um pecador, que precisa se beneficiar da correção. Note que compaixão não significa renunciar à disciplina aleatoriamente, principalmente quando a criança se arrepende imediatamente. Essa é uma visão distorcida da graça divina que resulta na inconsistência paternal e que pode plantar a hipocrisia na criança. Mas compaixão significa sim que limitamos a disciplina ao grau da ofensa moral, de modo que conquanto deva doer para ser eficaz, ela não machuca o corpo nem a alma da criança. A disciplina bíblica regulada, administrada com calma, não é abuso infantil e sim cuidado preventivo em relação à criança, que pode livrá-la de hábitos e práticas destrutivas.
Bater pode parecer não construir convicções íntimas na criança, porque se aplica força externa para controlar o seu comportamento, mas disciplina corporal, usada com justiça e amor, ajuda a formar convicções morais e religiosas. A consciência de toda criança testifica que há um Deus que nos ordena a fazer o bem e nos proíbe de fazer o errado, e que aqueles que desobedecem a Deus, fazendo o que é errado, merecem a sua punição (Rm 1:19-20, 32; 2:14-15). Contudo, desde a queda do homem, o diabo tem nos enganado com a mentira de que se nós pecarmos certamente não morreremos (Gn 3:4). Aqueles que acreditam nessa mentira pensam que sua iniquidade
não será descoberta e, por isso, desprezam e rejeitam o temor de Deus (Sl 36:1-2). “Desviam-se os ímpios desde a sua concepção; nascem e já se desencaminham, proferindo mentiras”, afirma Salmos 58:3, e a mentira mais fundamental é a de que o pecado é bom e a obediência é má. Assim, a consciência é enfraquecida, destruída e endurecida pelo diabo e pelo pecado.
Alguns pais tentam proteger seus filhos das consequências do pecado. Como resultado, seus filhos fracassam em perceber o resultado completo de seus maus comportamentos. Pais cristãos devem empregar uma medida justa de dor para ensinar a seus filhos que o pecado é ruim e a obediência é boa. Nós sabemos que a rebelião contra a autoridade, ódio e violência, fornicação, roubo, mentira e ganância trarão terríveis consequências sobre a criança quando ela se tornar um adulto e o levará enfim ao inferno (I Co 6:9). Crianças
devem aprender essa lição cedo, na segurança do lar. Disciplina corporal, “a vara da correção”, ajuda muito a fortalecer a consciência da criança quando ela é ainda pequena.
Princípio #2: Inculque convicções alegrando-se abertamente com decisões sábias
Se disciplina corporal desenvolve convicções negativas, então alegrar-se e elogiar a criança por fazer algo bom desenvolve convicções positivas. Provérbios 23:15-16 diz,“Filho meu, se o teu coração for sábio, alegrar-se-á também o meu; exultará o meu íntimo, quando os teus lábios falarem coisas retas.” Se você quer moldar o coração de seu filho para deleitar-se em fazer o bem, então você deve compartilhar a alegria do seu coração pela obediência dele.

Pais cristãos podem ficar receosos de elogiar seus filhos e fomentar o orgulho neles. Contudo, devem aprender com o exemplo do Senhor Jesus Cristo, que diz a seus servos fies, “Muito bem, entra no gozo do teu senhor” (Mt 25:21). Elogiar uma criança por fazer o correto é uma obrigação que devemos a ela no Senhor, “Porque Deus não é injusto para ficar esquecido do vosso trabalho e do amor” (Hb 6:10), e nem nós deveríamos ser. Cristo nos ensinou que deveríamos procurar motivação para servir ao Senhor, sabendo que o Pai sabe o que fazemos e nos recompensará publicamente com tesouros celestiais (Mt 6:4, 6, 18-21). Um filho de Deus deve viver em obediência
alegre com uma percepção do sorriso de seu pai. De mesmo modo, pais cristãos deveriam assegurar seus filhos com um sorriso pronto, palavras de louvor e outras recompensas apropriadas quando eles fazem o que é bom. Esse princípio é tão importante que o autor de Provérbios 23 retorna a ele nos versículos 24-25: “Grandemente se regozijará o pai do justo, e quem gerar a um sábio nele se alegrará. Alegrem-se teu pai e tua mãe, e regozije-se a que te deu à luz.”
Essas palavras são tanto um encorajamento aos pais quanto um guia sobre cuidados paternais. Alguns podem achar que é errado recompensar a obediência, mas a Bíblia declara que ao guardar a lei do Senhor, “há grande recompensa” (Sl 19:11). Nós sabemos, claro, que “essa recompensa não é por mérito, mas por graça” (Catecismo de Heidelberg, Q. 63); ou seja, a recompensa excede o mérito das nossas boas obras. Mas nós devemos fazê-lo, assim como o nosso Pai nos céus faz! Novamente, nós vemos o quanto é importante focar no coração. Como pais, não estamos simplesmente tentando controlar o comportamento dos nossos filhos; estamos treinando os seus corações para conhecer e fazer a vontade de Deus com prazer.
Continua aqui.
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joel beeke*Esse artigo foi originalmente publicado na revista The Banner of Sovereign Grace Truth (Edição online de Julho-Agosto2016) , traduzido com permissão do autor.

**Dr. Joel Beeke é presidente e professor de teologia sistemática no Puritan Reformed Theological Seminary (EUA). É pastor da Heritage Netherlands Reformed Congregation, editor da Banner of Sovereign Grace Truth, diretor editorial de Reformation Heritage Books, presidente da Inheritance. Foi co-autor, escreveu ou editou mais de 50 livros, dentre os quais, “Vivendo para a Glória de Deus” e “Vencendo o Mundo”. Obteve seu Ph.D. em Teologia da Reforma e Pós-reforma no Westminster Theological Seminary. Ele é convidado freqüentemente para lecionar em seminários e pregar em conferências ao redor do mundo. Ele e sua esposa, Mary, foram abençoados com três filhos: Calvin, Esther e Lydia.

*** Tradução: Sara Mendonca