A cena era comum e repetia-se diariamente quando Jesus visitava Jerusalém: Ele ia de madrugada para o monte orar e depois, bem cedinho, já estava no Templo, onde se sentava para, com a autoridade de um Mestre, ensinar a lei ao povo que ouvia com muita expectativa.

Naquele dia, entretanto, enquanto Jesus proferia sua aula sobre a lei, começa-se a ouvir um barulho até que Jesus silencia, enquanto escribas e fariseus apresentam um caso muito sugestivo, uma vez que o assunto discutido ali era a lei!

Eis o caso: Uma mulher apanhada em flagrante adultério. De um lado, Jesus precisava lidar com a lei de Moisés que dizia que tais pecados deveriam ser punidos com a morte – e ele já havia dito que veio para cumprir a lei (Mateus 5:17) –, de outro lado, lidava com a possibilidade clara de ensinar ao povo todo que a misericórdia triunfa sobre o juízo. Como ele poderia fazer as duas coisas ao mesmo tempo?

Vejamos o texto, então, para saber o que está em jogo, pois aparentemente Jesus está contra a parede aqui.

I – Escribas e Fariseus Tentam Acusar Jesus

O objetivo dos Fariseus e Escribas era claro: “6 Isto diziam ele para terem de que o acusar”. Eles trazem um caso teste para Jesus que teoricamente o deixaria sem saída: “Mestre, esta mulher foi apanhada em flagrante adultério e na lei, Moisés nos mandou apedrejá-la. Tu, pois, o que dizes?

Não falemos sobre a falsa lisonja de chamarem Jesus de “Mestre”, para “terem de que o acusar”, mas foquemos na situação da pobre mulher, que ainda que pecadora e adúltera, estava agora exposta de forma vergonhosa a “todo o povo” que estava ali. Todos assentados, inclusive Jesus, na sua posição de Mestre, exceto a mulher, que foi ali colocada “de pé”.

Imagine-se tendo seus pecados mais obscuros sendo expostos aos olhos de todas as pessoas daquela maneira que entenderá um pouco do que se passava na mente daquela mulher!

II – Eles Saem Acusados da Situação

Qual seria a resposta de Jesus? Se dissesse para não apedrejá-la, poderia ser acusado de quebrar a lei de Moisés; se mandasse apedrejar, deixaria de ensinar o valor da graça e do perdão, e, certamente, diminuiria a admiração, pois se igualaria aos fariseus na interpretação da lei.

Até porque em Levítico 20:10 e Deuteronômio 22:22-24 a lei mandava que ambos, homem e mulher fossem apedrejados, mas Jesus nem se utiliza dessa carta na manga.

Curiosamente ele fica calado e “se inclina para escrever com o dedo no chão”. Não nos interessa o conteúdo do que Jesus escreve, pois se nos interessasse isso seria informado pelo autor, mas isso causa uma animação nos acusadores que agora “insistem na pergunta”, como se tivessem vencido e encurralado o Senhor Jesus.

Enquanto toda essa trama acontece, a mulher ainda está estática, coitada, com todos os olhares nela. Até por isso, “Jesus se levanta” para dizer algumas palavras, depois “se assenta novamente e volta a escrever com o dedo no chão”; mas o que ele teria dito e feito que mudou tão drasticamente a cena?

Primeiro, os acusadores queriam ter do que acusar Jesus, mas agora, “ouvindo eles a resposta e acusados pela própria consciência, saem um a um… ficando só Jesus e a mulher no meio onde estava”.

Três coisas importantes aqui; primeiro, Jesus se levanta da sua posição de autoridade para proferir as palavras, fazendo com que os olhares saíssem da mulher e se virassem para ele. Depois ele se assentou, mostrando que sua autoridade independe de posição ou posto – mas vemos a compaixão de Jesus quando ele chama a atenção de todos para si (veremos mais sobre isso no último ponto).

Segundo, eis as palavras que ele profere: “Aquele que dentre vós estiver sem pecado, seja o primeiro que lhe atire a pedra”. Porque apenas essas palavras causariam tanta comoção? Bem, no original percebemos que Jesus estava lidando com aquele adultério, especificamente (lit. este pecado), o que indica que tudo foi organizado pelos escribas e fariseus exclusivamente para pegar Jesus. A mulher foi apenas uma prostituta paga e usada naquele caso; mas também era lei em Israel que aqueles que denunciavam um crime, jogassem a primeira pedra se fossem inocentes, pois isso seria um privilégio. Mas como não eram inocentes, saíram dali cabisbaixos.

Em terceiro lugar, Jesus cumpre a lei em não apedrejar a mulher, pois segundo o próprio livro de João, os mesmos escribas e fariseus, quando pedem a Pilatos que crucifique Jesus; e Pilatos os manda julgar pela própria lei dos Judeus, eles respondem, por estarem sob o jugo de Roma: “A nós não nos é lícito matar ninguém” (João 18:31).

III – A Mulher Ainda Tinha a Acusação Contra Ela

Resolvido o problema entre Jesus e os fariseus que foram mais uma vez humilhados pela verdade e sabedoria de Jesus, a mulher ainda estava ali, seminua, envergonhada, exposta à toda sociedade de Jerusalém.

Muitos podem se identificar com os acusadores até esse ponto. São ávidos em apontar os erros dos outros, mas esquecem que muitas vezes cometem exatamente aquilo que condenam. Que essa hipocrisia seja extirpada do nosso meio.

Mas alguns dos leitores podem se identificar aqui com essa mulher. Se esse for o seu caso, se você percebe que é pecador(a), saiba que todos os olhos desse mundo não podem ser mais perigosos que os olhos daquele que estava diante daquela mulher.

Ele era o único que poderia atirar todas as pedras e ser absolutamente justo, mas o texto diz que em vez disso, mais uma vez “erguendo-se Jesus”, começa a dialogar com a aquela mulher.

Seus olhos, em lugar de ódio e julgamento, naquele momento foram de compaixão e perdão: “Eu tampouco te condeno”. Mas note que essas palavras de Jesus teriam drásticas consequências. Pois ele ainda tinha a lei que condenava aquela mulher para o inferno, assim como condena você que me lê por causa dos seus pecados.

Quando Jesus mais uma vez se levanta, “não há mais ninguém ali além da mulher”, então ele se levanta para mostrar a ela que suas palavras de perdão o levaria ao lugar dela. Ele não seria meramente apedrejado pelo adultério dela, mas a ira de Deus recairia completamente sobre ele, para que ele pudesse dizer aquelas simples palavras de perdão.

Você pode também, ao ler essa história, entender que Jesus graciosamente está se oferecendo para perdoar seus pecados, mas saiba que ele pagou de forma dramática na cruz, por isso é que “a cruz de Cristo nos constrange”.

Finalmente, não pense que o perdão de Jesus deixa você continuar na sua vida de pecado. Assim como aquela mulher teve a sua vergonha e a sua culpa cobertas por Jesus, pois ele levou sobre si; ela saiu dali com a sua vida transformada.

Jesus disse a ela: “agora vai e não peques mais”. Faça você o mesmo. Você que agora tem a sua consciência pesada por causa do seu pecado, lance tudo sobre Cristo, pois ele tem cuidado de nós. E aprenda a delícia que é andar em novidade de vida!

Note que as únicas palavras dessa mulher foram: “Ninguém Senhor”, o mesmo é suficiente para você aprender que se Cristo libertar e salvar você, o seu passado é completamente esquecido por ele; afinal, ainda que sejamos sujos de pecado, nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus.

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* Pr. Samuel Vitalino é o feliz esposo de Patrícia Vitalino e pai de Judah e Nathan. Natural de Pernambuco, reside atualmente na cidade de Salvador. Graduou-se em Direito e trabalhou na área por algum tempo decidindo posteriormente abraçar o ministério pastoral. Estudou no Western Reformed Seminary, M.Div e no Greenville Presbyterian Theological Seminary, ThM. Atualmente pastoreia a Igreja Presbiteriana de Brotas em Salvador-Ba.